Mais de cinco mil professores de 12 concelhos do distrito de Leiria concentraram-se, esta segunda-feira de manhã, na baixa da cidade, em resposta ao apelo da Fenprof - Federação Nacional de Professores, que assinalou mais uma greve distrital de docentes. A paralisação conduziu ao encerramento de várias escolas.
Corpo do artigo
"O Governo não pode continuar cego àquilo que está a acontecer na nossa profissão. Cada vez mais há menos professores nas escolas", afirmou Mário Nogueira. "No ano passado, aposentaram-se 2400 colegas e entraram nos cursos de formação menos de 1200. Este ano, só em janeiro e em fevereiro, vão aposentar-se 500."
O dirigente sindical lamentou que não haja jovens que queiram ser professores, devido à "desvalorização da profissão". "Tem de ver com o facto de um professor, para poder ir trabalhar para algumas regiões deste país, ter de pagar para trabalhar, porque o salário não é suficiente. Será que o Governo não vê isto?"
"Será que em vez de valorizar a profissão prefere ir recorrendo a diplomados noutras áreas para irem eles dar aulas. A formação de professores é ou não importante?", questionou Mário Nogueira "Este ano, só no primeiro período, o Governo teve de contratar mais de 60% de diplomados não profissionalizados para poder disfarçar a falta de professores", denunciou.
40 mil alunos sem docentes
Apesar disso, o secretário-geral da Fenprof assegurou que o primeiro período acabou com 25 mil alunos sem os professores todos e, este período, iniciou com mais de 40 mil alunos nas mesmas circunstâncias. "Que caminho quer o Governo seguir? Quer dar cabo da profissão dos professores? Exigimos a valorização da profissão e não permitimos que o Governo continue a tratar com os pés os professores e os educadores. Exigimos respeito."
"Há linhas vermelhas que não podemos pisar. Por exemplo, têm uma norma de vinculação que pode integrar nos quadros docentes contratados a termo com 1095 dias e que, este ano, se encontrem em horário completo e anual", explicou. "O que não diz é que provavelmente ao não ser alterada aquela norma vão vincular colegas, e bem, no seu quarto ano de serviço, e vão ficar de fora colegas, e mal, com 15 ou 20 anos de serviço contratados a termo."
Mário Nogueira manifestou ainda desagrado por o Governo querer aumentar de dez para 64 Quadros de Zona Pedagógica (QZP). A seu ver, esta estratégia pretende dar a possibilidade de o Conselho Local de Diretores de distribuir serviço a professores dos quadros em todas as escolas e agrupamentos nos QZP. "Se um professor efetivar com 12 horas a menos de componente letiva, deixa de ser professor daquela escola para ir completar horários a outras."
O dirigente associativo defendeu a contagem integral do tempo de serviço para evitar que os jovens abandonem ou não escolham a profissão. Aos seis anos, seis meses e 23 dias somou dois a quatro anos de transições entre estruturas, em 2007 e em 2009, e afirmou ainda estarem a "roubar o tempo de serviço aos cerca de seis mil professores parados no quarto e no sexto escalão".
Excelente, mas sem vaga
É o caso de Patrícia Machado, 49 anos, professora de inglês, na Batalha. "Dou aulas há 27 anos e estou no quarto escalão. Fui avaliada em excelente, mas não subi porque não havia cotas. Estou há anos a marcar passo", assegura. "E vejo colegas com menos tempo de serviço que sobem de escalão, porque estão noutras escolas, porque vêm do privado, dos Açores ou da Madeira, e isto revolta-me."
Natural de Pombal, Patrícia Machado confessa que só conseguiu ser mãe há nove anos, porque não teve condições para constituir família antes. Além de ter participado na concentração da Fenprof por se sentir lesada, salienta que há outros problemas nas escolas de que as pessoas não têm conhecimento. "Não há segurança, não há assistentes operacionais suficientes, não há professores suficientes, fazemos trabalho burocrático, e não temos tempo para preparar aulas", denuncia.
"Somos pressionados para dar notas aos alunos para que passem, quando sabemos que não têm os conhecimentos que deviam ter, e os alunos apercebem-se disto e desresponsabilizam-se pelo seu percurso escolar", afirma a professora de inglês. "Andamos a enganar o país, os pais, os alunos, porque somos pressionados há anos para corresponder às estatísticas", acusa. "A escola está moribunda e parece que o país não se apercebeu, nem o Governo. Estamos a hipotecar a nossa sociedade, porque a educação é a base de tudo."
Professora do ensino especial na Batalha, Susana Veiga, 47 anos, também se queixa de excesso de burocracia, da paragem na contagem do tempo de serviço e do facto de não haver ajudas de custo. Apesar de já estar efetiva, assegura que já fez milhares de quilómetros. Agora, a sua preocupação é com a municipalização. "O Governo anda a atirar areia para os olhos das pessoas. É tudo uma fantochada."
800 euros em gasóleo
Rute Henriques, 49 anos, professora de matemática e de ciências em Leiria, mas pertence ao QZP de Lisboa. "Fui contratada ao longo de 17 anos. Nos cinco anos em que estive em Lisboa, gastava em portagens e em gasóleo 800 euros. Ia e vinha todos os dias", conta. "Levantava-me às 5 da manhã, para poder estar às 8 em Lisboa. Chegava a casa perto das nove da noite para dar banho ao meu filho e o ajudar nos deveres."
"Foi um sacrifício muito grande. Meu e do meu marido", assegura a professora de matemática e de ciências. Hoje, o filho tem 16 anos, mas Rute não está disponível para voltar a pagar 800 euros por mês para ir dar aulas, pois o dinheiro faz-lhe falta para o filho poder prosseguir estudos a nível superior.