Pneumologistas e oncologistas elogiam as medidas propostas pelo Governo para combater o tabagismo, mas queriam ir mais longe. Defendem um aumento significativo do preço dos cigarros e uma fiscalização muito ativa das regras sobre a venda e consumo de tabaco.
Corpo do artigo
O Governo vai aprovar, na quinta-feira, em Conselho de Ministros uma proposta de lei com alterações à Lei do Tabaco, como noticiou o JN esta quarta-feira.
Algumas das medidas decorrem da necessidade de transpor para a legislação nacional, até 23 de outubro, uma diretiva europeia que equipara os produtos de tabaco aquecido ao tabaco convencional no que respeita a odores, sabores e advertências de saúde. Na prática, o tabaco aquecido fica sujeito às mesmas regras dos cigarros convencionais e cigarros eletrónicos, regras essas que vão ser apertadas.
Aproveitando estas alterações, o Governo propõe outras medidas que visam dificultar o acesso, reduzindo os locais de venda de tabaco, e limitando o seu consumo, com o alargamento das zonas onde é proibido fumar.
16324701
Uma das medidas da proposta de lei pretende alargar, já a partir de outubro, a proibição de fumar ao ar livre no perímetro de estabelecimentos de saúde, escolas e universidades, recintos desportivos, estações, paragens e apeadeiros dos transportes públicos. Nas esplanadas com algum tipo de cobertura, à porta ou junto a janelas de cafés, restaurantes, bares, também não será permitido fumar.
"O consumo passivo provoca quase as mesmas doenças que o consumo ativo. É preciso proteger quem não fuma", defende Sofia Ravara, coordenadora da Comissão de Trabalho de Tabagismo da Sociedade Portuguesa de Pneumologia.
A pneumologista concorda com o alargamento da proibição de fumar em espaços exteriores, destacando a importância dos recintos das universidades serem zonas sem fumo, para prevenir o consumo entre os jovens.
A proposta de lei propõe ainda estender a proibição da venda de tabaco, direta ou através de máquinas, à generalidade dos locais onde é proibido fumar, a partir de janeiro de 2025, incluindo estações de serviço. Se esta medida vier a ser aprovada na Assembleia da República, a venda de tabaco fica praticamente limitada a tabacarias e aeroportos.
"Máquinas de vending deviam ser totalmente abolidas"
Sofia Ravara considera que a redução dos locais de venda "é uma medida muito interessante e eficaz" e defende que "as máquinas de venda automática deviam ser totalmente abolidas porque promovem o consumo entre os jovens".
Realçando que Portugal é um dos países onde a experimentação do tabaco começa mais cedo, a pneumologista defende um aumento consistente do custo de todos os produtos de tabaco, cigarros eletrónicos e acessórios, bem como uma maior fiscalização das regras de publicidade, marketing e patrocínios da indústria do tabaco. Sofia Ravara considera ainda que deve ser dada especial atenção às redes sociais, onde artistas e "influencers", com milhares de seguidores jovens, passam imagens e mensagens promotoras do tabagismo e do uso dos novos produtos, tabaco aquecido e cigarros eletrónicos.
Aludindo à discussão que se segue na Assembleia da República, antes da votação da proposta de lei, a médica não tem dúvidas: "se as medidas não forem implementadas, é por interferência da indústria do tabaco".
Oncologista defende "zero permissividade" ao tabagismo
Elogiando as propostas do Governo e o facto de "finalmente colocar a luta contra o tabaco como uma prioridade", o presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia lamenta que o Executivo "não tenha tido coragem para ir mais longe".
Notando que a proposta de lei tem por base uma meta que se pretende atingir dentro de 17 anos - uma geração livre de fumo em 2040 - Miguel Abreu considera que são necessárias "medidas mais gravosas e também impopulares", como uma subida significativa dos preços, um agravamento das multas para os incumpridores e uma maior fiscalização. "Temos de travar uma luta sem precedentes contra o tabaco, com permissividade zero", defende o oncologista do IPO do Porto, lembrando que o tabagismo é o principal fator de risco para vários tipos de cancro.
A par das medidas restritivas, Miguel Abreu gostaria que o Governo e o Ministério da Saúde procurassem melhorar o acesso a consultas de desabituação tabágica e avançassem com a comparticipação de medicação tabágica. "Faltou essa interligação", lamentou o médico.
Posição semelhante tem o presidente da Fundação Portuguesa do Pulmão (FPP). Em declarações à Lusa, José Alves defendeu esta quarta-feira que o Governo devia ter ido mais longe nas novas regras da Lei do Tabaco, sobretudo aumentando o preço e reforçando a fiscalização e as coimas.
O responsável considerou as medidas "requentadas", destacando apenas como positivo a proibição da venda de tabaco direta ou através de máquinas de venda automática em locais como restaurantes, bares, salas e recintos de espetáculo, casinos, bingos, salas de jogos, feiras e exposições, que entrará em vigor em 2025.