Morte medicamente assistida só vai poder ocorrer dois meses após início do processo
O texto de substituição dos projetos de lei para regulamentar a morte medicamente assistida foi debatido, esta quinta-feira, pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. O documento, ao qual o JN teve acesso, define que a concretização da morte medicamente assistida só pode ocorrer dois meses após o início do processo e garante o acesso do doente a acompanhamento psicológico.
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Em causa está um texto de substituição para dar resposta ao veto do Presidente da República, no final da última legislatura, ao decreto sobre a morte medicamente assistida. "O referido veto interpela-nos a clarificar o texto então aprovado por larguíssima maioria na Assembleia da República, na medida em que a não uniformização formal de um conceito operativo importante colocaria dúvidas acerca do alcance normativo do diploma", lê-se no documento, com o qual os deputados esperam que "os equívocos formais" fiquem "desfeitos".
O novo texto está agora em discussão na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. As principais alterações face aos diplomas já aprovados prendem-se com a obrigatoriedade do doente ser acompanhado por um psicólogo e a introdução de prazos para evitar demoras. Neste domínio, o projeto de lei define que "a concretização da morte medicamente assistida não pode ter lugar sem que decorra um período de dois meses a contar da data do pedido de abertura do procedimento".
Mas há mais prazos fixados. Segundo o documento, o médico orientador do processo tem de emitir, no prazo de 20 dias a contar da abertura do procedimento, um parecer fundamentado sobre se o doente cumpre todos os requisitos para aceder à morte medicamente assistida. Caso seja favorável, o doente necessita de um outro parecer do médico especialista na patologia que o afeta. A deliberação tem de ser elaborada no prazo máximo de 15 dias.
Em caso de dúvidas "sobre a capacidade da pessoa para solicitar a morte medicamente assistida revelando uma vontade séria, livre e esclarecida" ou de a "pessoa ser portadora de perturbação psíquica ou condição médica que afete a sua capacidade de tomar decisões", o médico orientador pode também solicitar o parecer de um psiquiatra.
No que toca ao apoio psicológico, o utente terá acesso a acompanhamento "ao longo de todo o procedimento", "salvo se o rejeitar expressamente". O objetivo é "garantir a compreensão plena das suas decisões" bem como "o esclarecimento das relações e comunicação entre o doente e familiares, assim como entre o doente e os profissionais de saúde que o acompanham, no sentido de minimizar a possibilidade de influências indevidas na decisão". O documento clarifica ainda que "ao doente é sempre garantido, querendo, o acesso a cuidados paliativos".
Quanto à escolha do local para a prática da morte medicamente assistida, o doente pode escolher entre os estabelecimentos de saúde do Serviço Nacional de Saúde e "os setores privado e social que estejam devidamente licenciados e autorizados para a prática de cuidados de saúde". A lei considera que a morte medicamente assistida não punível ocorre "por decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de sofrimento de grande intensidade, com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença grave e incurável, quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde".
O projeto de lei prevê ainda a criação da Comissão de Verificação e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Morte Medicamente Assistida. Será composta por cinco personalidades: um jurista indicado pelo Conselho Superior da Magistratura, outro nomeado pelo Conselho Superior do Ministério Público, um médico e um enfermeiro indicados pelas respetivas ordens profissionais e um especialista em bioético indicado pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida. Estes elementos devem ser designados "no prazo de 20 dias" a contar da entrada em vigor da lei.
Nenhum profissional de saúde pode ser obrigado a praticar morte medicamente assistida. "A recusa do profissional deve ser comunicada ao doente num prazo não superior a 24 horas e deve especificar a natureza das razões que a motivam", lê-se no documento.