Saúde mental: "Não basta ter uma bondosa lei se depois tivermos as pessoas à espera no terreno"
Até é uma boa lei mas faltam meios para a executar. Foi assim que a oposição viu, esta quinta-feira, a proposta de lei do Governo para a saúde mental, que mereceu rasgados elogios da diretora-geral de Saúde, Graça Freitas.
Corpo do artigo
"Não basta termos uma lei progressiva se não tivermos meios para esta lei ter aplicação no terreno", vincou a deputada social-democrata Helga Correia, numa audição parlamentar em que a diretora-geral de Saúde, Graça Freitas, teceu rasgados elogios à proposta de lei do Governo para a saúde mental, aprovada, na generalidade, a 14 de outubro passado.
"Pretende apoiar e dar dignidade a pessoas que precisam de apoio especial na defesa dos seus direitos. É assim que vejo esta lei, com muitos bons olhos, quase que a endossava. É uma lei humanista, com propósitos bem definidos", defendeu Graça Freitas, enumerando uma série de "virtudes".
Uma dessas virtudes é a possibilidade de serem usados 88 milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para reformar a saúde pública até 2026. Por exemplo, conforme o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, revelou, ao entregar a proposta de lei no Parlamento, prevê-se a criação de quatro novas unidades de internamento em hospitais gerais, 1.500 novos lugares nos cuidados continuados, a requalificação de 20 entidades dos serviços locais de saúde mental, além da criação de 40 novas equipas de saúde comunitária.
Para o PSD, "é bom" que estejam disponíveis os 88 milhões de euros. Mas não chegam, "tendo em conta as listas de espera". "Não basta ter uma bondosa lei se depois tivermos as pessoas à espera no terreno", vincou Helga Correia. "As leis, até agora, têm sido etéreas e a realidade em Portugal é dramática", atirou o deputado do Chega, Pedro Frazão.
Já o deputado comunista João Dias defendeu que, primeiro, devia de ter sido feita uma análise da lei atual, em vigor há 20 anos. "O que não se tem conseguido implementar e ao que a lei atual não corresponde?", especificou, apontando que falta ainda uma lei de emergência na saúde mental.
"Os 88 milhões do PRR são como a história do copo meio cheio ou meio vazio. Até 2008, falava-se em cinco milhões de euros para a saúde mental. Ouvir falar em 88 milhões de euros faz-me ficar com olhos à Tio Patinhas", respondeu a psiquiatra e membro da coordenação nacional das políticas de saúde pública, Ana Matos Pires, embora assuma que lamenta que o PRR seja destinado "a paredes e não a recursos humanos". É que, para Ana Matos Pires, ainda é preciso "aumentar os recursos humanos em saúde pública no país", apesar dos avanços que já aconteceram como o da criação de 20 equipas comunitárias de saúde mental.
"Continuamos a insistir que precisamos de recursos humanos. É importante termos a lei mas precisamos que chegue às pessoas", concluiu Helga Correia.