A Região Norte registou uma queda abrupta do número de inscritos para cirurgias desde março, o que comprova uma diminuição da acessibilidade aos cuidados de saúde e indicia que o número de intervenções cirúrgicas por realizar em todo o país será ainda maior do que o avançado pela tutela.
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Durante a pandemia, a mediana do tempo de espera para cirurgia na região mais afetada do país derrapou um mês. Os doentes que aguardam por uma operação para lá do tempo legalmente previsto são agora 30% do total.
A monitorização da lista de inscritos para cirurgia da Administração Regional de Saúde do Norte (ARSN) revela que a 7 de maio estavam inscritos para cirurgia 90 866 doentes, menos 9819 (10%) do que em fevereiro.
Desde janeiro de 2018 que o número de inscritos não era tão baixo. A lista aumenta todos os anos, refletindo não só o envelhecimento da população, mas também a acessibilidade aos cuidados de saúde.
A diminuição da lista de inscritos para cirurgia resulta da suspensão de consultas e exames de diagnóstico nos cuidados primários e hospitalares decretada no âmbito do combate à covid-19. A retoma da atividade foi iniciada em maio na maioria das unidades, e entretanto suspensa em alguns hospitais da região de Lisboa e Vale do Tejo devido ao aumento do número de casos de covid-19.
Recuo a janeiro de 2008
O relatório, disponível no site da ARSN, indica ainda que, a 7 de maio, a mediana do tempo de espera para cirurgia era de 4,1 meses (3 meses em fevereiro), um resultado que não se via desde janeiro de 2008.
A monitorização revela ainda que, no início de maio, 30,5% das cirurgias em espera (mais de 27 mil) já tinham ultrapassado os tempos de resposta legais. Quase metade das cirurgias prioritárias (48%) e muito prioritárias (47%) não respeitaram estes limites.
O bastonário da Ordem dos Médicos alertou na semana passada para a inversão da curva de inscritos na Região Norte, concluindo que há mais cirurgias por realizar do que o anunciado.
"O número de doentes inscritos para cirurgia foi extraordinariamente baixo. Quando a ministra da Saúde diz que faltam recuperar 51 mil doentes aos quais adiaram as cirurgias, são os 51 mil que estão em lista de espera, mas durante três meses podíamos ter inscrito 50 ou 100 mil doentes para serem operados e não inscrevemos porque tudo ficou mais ou menos parado", afirmou Miguel Guimarães.
Também o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares chamou a atenção para o facto quando a ministra da Saúde disse que, até abril, ficaram por realizar 51 mil cirurgias. "Estamos a falar de 50 mil doentes que não fizeram estas cirurgias, pelo menos, e muitos que não tiveram diagnóstico", afirmou Alexandre Lourenço, lembrando que os hospitais deixaram de ter referenciações dos centros de saúde para realizar consultas que "originariam propostas cirúrgicas, propostas terapêuticas e meios complementares de diagnóstico".
Plano de Estabilização
Mais de 33 milhões de euros para equipas acelerarem recuperação
O Plano de Estabilização Económica e Social, publicado em Diário da República, contempla 33,7 milhões de euros para recuperação da atividade perdida por causa da pandemia. São 7,7 milhões de euros para recuperar todas as primeiras consultas e 26 milhões para recuperar um quarto das cirurgias perdidas. Depois de se ter chegado a admitir recorrer aos privados, o modelo encontrado pelo Governo valoriza a produção no Serviço Nacional de Saúde. A verba destina-se a aumentar o limite máximo do valor que já era pago aos profissionais do SNS pela produção adicional: no caso da primeira consulta, o limite sobe de 55% para 95%, enquanto nas cirurgias, que já ultrapassaram os tempos máximos de resposta garantida, aumenta de 55% para 75%.
Reforço
Contratações
O Plano de Estabilização Económica e Social 2020 destina quase 100 milhões de euros para reforço do Serviço Nacional de Saúde. Entre outras medidas, está prevista a contratação de quase três mil profissionais de saúde até dezembro.
Cuidados intensivos
O plano quer reforçar a medicina intensiva para dar resposta a novas ondas de covid-19, mas também a um aumento dos doentes que procuram o SNS tardiamente e com patologias mais graves. São 26 milhões de euros para investir em 16 serviços de Medicina Intensiva do SNS e e em sistemas de informação mais eficazes.