Pedro Passos Coelho colou o mais que conseguiu António Costa a José Sócrates. António Costa frisou o maior número de vezes possível que Pedro Passos Coelho mentiu.
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No meio de uma hora e meia de debate em formato inédito, transmitido esta quinta-feira à noite pelos três canais de televisão de sinal aberto, ficaram por esclarecer, entre outras, as questões da Saúde, da sustentabilidade da Segurança Social, da carga fiscal e do emprego. E nenhum quis comprometer-se com o montante das promessas.
Os dois candidatos a primeiro-ministro concentraram-se mais no passado do que no futuro. Passos insistiu em falar do que aconteceu até 2011, até ao pedido de resgate financeiro. Costa reiterou o que aconteceu depois de 2011, com a aplicação do dobro das medidas exigidas pela troika. Passos não levou papéis, Costa foi munido de vários gráficos sobre o desempenho da coligação PSD/CDS-PP. Nenhum respondeu ao que fará se perder as eleições ou se não tiver maioria absoluta.
Ambos usaram o ataque como estratégia de fuga a várias perguntas. Exemplo: O que responde a um português de 50 anos que espera receber a sua pensão daqui a 15? Diz Passos: "Que para ter a certeza de que a vai receber tem de haver uma reforma, porque o sistema hoje está em causa. E a solução proposta pelo PS custa mais de 5,5 milhões de euros em quatro anos". Diz Costa: "Não aceitaremos qualquer novo corte nas pensões. O grande buraco que existe hoje no sistema foi criado por este Governo, que levou à perda de oito mil milhões de euros".
O modelo para a sustentabilidade do sistema de pensões era o mais difícil de explicar em dois minutos (tempo de cada um para a resposta), mas ambos estiveram de acordo num ponto: propõem caminhos completamente diferentes.
Guerra de números e troika
Passos Coelho e António Costa recusaram comprometer-se com os números dos seus programas para o futuro, mas levaram de cor o fracasso dos números do passado que queriam sublinhar. O secretário- -geral do PS denunciou que o atual Governo é o primeiro na história da democracia portuguesa que não acaba a legislatura com Produto Interno Bruto (PIB) positivo. E ilustrou: Guterres saiu com o PIB a crescer 25%, Durão com 0,8%, Sócrates com 1,9%. Com Passos, o PIB tem um saldo negativo de 4%.
Passos tinha números para a troca. Entre 2005 e 2011, período socialista, a dívida passou de 96 mil milhões de euros para 195 mil milhões. Costa voltou a atacar: "Em Lisboa, reduzi a dívida em 40%; no país, o governo aumentou-a em 19%". Torna Passos: nos seis anos de Governo Sócrates foram destruídos 174 mil empregos, "nós criámos 204 mil". Volta Costa: a troika pediu um corte de 200 milhões na saúde, o Governo cortou 500 milhões. Passos: "Herdei uma dívida superior a 3,7 milhões na saúde e o senhor esqueceu-se de dizer que baixou a dívida de Lisboa porque lhe demos os terrenos do aeroporto". Costa retificou: "O Governo não deu, pagou. Quis privatizar a ANA, teve de pagar os terrenos. Nós aplicámos os 287 milhões a abater a dívida. E o Governo onde gastou os três mil milhões da privatização?"
A guerra de números continuou em todos os temas, sempre com Passos a argumentar que com o PS de Costa o país voltará "às experiências de Sócrates", desbaratando os sacrifícios destes quatro anos. E com Costa a sublinhar que com a coligação de Passos, o país que em quatro anos regrediu 13, continuará a andar para trás, recordando as promessas que o governante quebrou mal chegou: nos impostos, nos salários, nas pensões.
A troika foi a lição mais bem estudada pelos dois. Passos queria responsabilizar o PS pelo resgate. Costa queria vincar que o Governo quis ir além da troika. Mas o socialista levou ainda um exercício de memória: o dia em que o atual primeiro-ministro afirmou ao JN: "A troika está cá a nosso pedido". E o dia em que Eduardo Catroga, então mandatado pelo PSD para conduzir as negociações, se orgulhou de ter influenciado o programa de austeridade. Passos admitiu que teve uma reunião com a troika, mas esclareceu que quem a chamou foi o ministro Teixeira dos Santos e que qualquer tentativa de colar a troika ao PSD é "uma mistificação" e "uma questão ridícula".
Na reta final do debate, António Costa tinha ainda um trunfo para tirar da manga: o programa VEM, destinado aos portugueses que emigraram e querem voltar. "Quantos já foram apoiados pelo programa?" perguntou. E ele próprio respondeu: "Zero". E Passos Coelho não o desmentiu.