Na Área Metropolitana do Porto (AMP), o carro ainda é o meio predileto nas viagens interurbanas, em detrimento do transporte público.
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"O principal problema reside no tempo perdido nos transportes de quem tem de se deslocar das periferias para a parte mais central da AMP. Os sistemas públicos estão muito congestionados, não deixando outra opção às pessoas que não seja a utilização do transporte individual", considera Álvaro Costa, professor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP).
Também Paulo Pinho, da FEUP, aponta o "congestionamento do tráfego automóvel" como "o principal problema" da mobilidade. "Embora a oferta de infraestruturas rodo e ferroviárias, e de serviços de transporte público tenha vindo a aumentar, este aumento não tem compensado o crescente recurso ao automóvel, com o consequente agravamento das condições de circulação, em particular nas horas de ponta", afirma.
Segundo este especialista, "67,6% das deslocações diárias na AMP são realizadas em automóvel, com uma ocupação média de apenas 1,56 pessoas, em detrimento do transporte coletivo". Alerta Paulo Pinho que, "do ponto de vista ambiental, e tendo em atenção as metas de redução de carbono para 2030 e para 2050, a situação atual nas áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa é insustentável".
Para melhorar a mobilidade, o metro na linha Rubi, a partir de 2026, afigura-se crucial. "Ao contrário das últimas expansões, a linha Rubi dará um grande aumento de capacidade à rede de transportes porque vem resolver um estrangulamento, que é o atravessamento do rio Douro. Todas as pontes estão congestionadas: a linha Amarela do metro, as pontes da Arrábida e do Freixo . Também não conseguimos ter mais comboios suburbanos na Ponte de São João, por falta de equipamento e pela mistura de tipos de tráfego", sublinha Álvaro Costa.
"A linha Rubi vai equilibrar a utilização da linha Amarela, porque parte da sua procura atual passará para esta nova linha. A Amarela poderá atrair novos passageiros, pessoas que atualmente utilizam a sua viatura individual por falta de capacidade nos veículos. A Rubi vai facilitar as transferências dos passageiros do comboio para o metro, em Gaia. Passarão a poder fazê-lo nas Devesas e a própria linha Amarela passará a ter capacidade disponível", antecipa.
Sobrecarga na Amarela
As vantagens do reforço do metro são igualmente evidenciadas por Paulo Pinho. "Se os padrões de mobilidade da população estabilizarem, haverá certamente uma redução visível do tráfego automóvel entre o Porto e Gaia, por captação de novos utentes para o metro, como aliás se tem verificado no passado, sempre que uma nova linha de metro é aberta. Os estudos de procura desenvolvidos na FEUP mostram esta capacidade de captação de forma clara, o que justificou plenamente a decisão de investimento na linha Rubi", diz.
A Rubi será antecedida pelo prolongamento da Amarela, que está por meses. "Certamente que a extensão da linha Amarela até Vila d"Este [obra fica pronta no final deste ano e haverá composições nos trilhos no primeiro trimestre de 2024] irá aumentar o número atual de utentes nesta linha, que já tem uma sobrecarga considerável, sobretudo nas horas de ponta, em que é visível a sua incapacidade de responder, com qualidade, a tanta procura. Dito isto, a futura linha Rubi, para além de servir novas áreas na cidade de Gaia com grande procura potencial, irá certamente aliviar a linha Amarela, oferecendo uma nova ligação alternativa à Boavista, no Porto", regista.
Atenção à "Uberização"
Na rodovia, para descongestionar o tráfego nas cidades, Paulo Pinho defende mudanças na gestão nas autoestradas, uma velha questão debatida pelo Conselho Metropolitano.
"Ao nível da circulação rodoviária, a rede de autoestradas que serve a AMP é bastante satisfatória. O problema não reside na rede em si, mas na sua gestão. Os incentivos económicos praticados, nomeadamente o valor das taxas de portagem, são contraditórios com as boas práticas de gestão da mobilidade. É preciso repensar todo o sistema de portagens, e os correspondentes contratos de concessão, por forma a aliviar quem circula na periferia metropolitana, e penalizar quem circula no núcleo central, incidindo em particular sobre o tráfego pesado de mercadorias e sobre os trajetos de atravessamento, total ou parcial."
Nas "zonas urbanas mais densas das cidades", Paulo Pinho fala da "crescente "uberização" da mobilidade de pessoas e pequenas mercadorias, que vão infernizando os espaços centrais citadinos, impondo-se, por isso, maior rigor na disciplina do uso automóvel". O professor não esquece o papel dos modos suaves, em especial das bicicletas. "Importa passar de uma lógica de lazer para uma lógica de uso quotidiano e regular, repensando os circuitos e as ciclovias", observa.