Matrizes de reabertura pedidas por António Costa aos peritos dão respaldo para avançar já com creches e pré-escola.
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Os planos apresentados pelos peritos no Infarmed deram ao Governo margem de manobra para iniciar a reabertura do país, retomando o ensino presencial das creches e do pré-escolar e vendas ao postigo. Agora, a decisão será política e, dentro do Executivo, ainda nenhuma está tomada. Até porque se mantêm duas visões em confronto: há quem retenha a mira na Páscoa e quem queira iniciar mais cedo uma reabertura controlada das escolas que, aliás, o Governo já começou a preparar.
António Costa tem pouco tempo para sedimentar ideias, já que amanhã se reúne com o presidente da República e com os parceiros sociais. Ainda vai auscultar os partidos e simplificar as matrizes propostas pelos peritos, antes de anunciar o plano de reabertura, na quinta-feira. Para isso, dispõe agora de "uma base científica mais sólida", disse o primeiro-ministro, após a reunião no Infarmed. Em cima da mesa, sabe o JN, estão várias opções, sendo que a reabertura da escola para crianças mais pequenas teve o respaldo dos planos apresentados esta segunda-feira.
O regresso já está a ser preparado. Domingo, o Governo reuniu de urgência para autorizar a compra de testes rápidos para as escolas. Na semana passada, o Ministério da Educação deu dinheiro às escolas para a compra de máscaras também para o 1.º ciclo e a Saúde admitiu incluir os professores no grupo de vacinação prioritária.
Cenários em cima da mesa
Os planos para a reabertura das aulas de forma faseada começam nos níveis de ensino mais baixos - seguindo, aliás, a intenção manifestada pelo Governo, de fazer regressar aos bancos da escola os alunos com menor autonomia no estudo e cujo progresso escolar mais está a ser afetado pelo ensino à distância. Exatamente que níveis serão esses é outra questão: apenas a creche e o pré-escolar ou alargar já ao 1.º ciclo ou, mesmo, até ao 6.º ano?
Esta solução teria várias vantagens. Primeiro, faria regressar à escola os alunos mais vulneráveis - esta terça-feira completam-se 80 dias de ensino remoto desde o início da pandemia, nas contas de Filinto Lima, da Associação de Diretores de Escolas (ANDAEP). Além disso, mostraria que a redução do contágio e dos internados tem tradução concreta no aliviar das restrições impostas no início do ano.
Em confronto, todavia, está quem prefere adiar a reabertura das escolas para depois da semana de férias da Páscoa, ou seja, a 5 de abril - seguindo, aliás, a data que foi perspetivada por António Costa e por Marcelo Rebelo de Sousa (esta segunda-feira, na reunião, o presidente da República não tomou a palavra). Neste cenário, a reabertura englobaria de uma só vez todos os níveis de ensino.
Mais do que o receio de contágios dentro das escolas, esta visão argumenta que as escolas abertas levam a um relaxamento global da população e, por outro lado, dão margem a que outros setores reclamem o regresso ao trabalho, como a restauração, os cabeleireiros ou os ginásios. Além disso, a prevalência de novas estirpes, mais contagiosas e resistentes às vacinas, redobra o receio de que a pandemia volte a sair do controlo.
As ameaças que ainda pairam sobre o país foram resumidas por Marta Temido, ministra da Saúde: o risco de transmissão está a subir desde 10 de fevereiro, a variante do Reino Unido tem uma prevalência superior a 60% e os portugueses estão a aderir menos às medidas de confinamento.
Partidos admitem que está na hora de desconfinar
Os partidos defenderam, após a reunião no Infarmed, que já existem condições para se iniciar o desconfinamento. Antónia Almeida Santos, do PS, sustentou que o plano de reabertura "terá de ser, necessariamente, cauteloso, rigoroso e gradual", sublinhando que Portugal tem hoje o índice de transmissibilidade "mais baixo da Europa". Ricardo Batista Leite, do PSD, considerou já haver "condições" para desconfinar "em grande parte do território". No entanto, criticou o Governo por anunciar o plano esta quinta-feira e começar a aplicá-lo na segunda, afirmando existir "muito pouco tempo" para os diversos setores "se prepararem". Moisés Ferreira, do BE, acusou o Executivo de estar a "perder tempo" e de não ter ainda apostado na testagem massiva. Jorge Pires, do PCP, admitiu já estarem "criadas as condições" para o desconfinamento, mas exigiu a contratação dos 500 profissionais de saúde pública previstos no Orçamento. Paulo Duarte, do CDS, disse haver margem para um desconfinamento "gradual" e "cauteloso", pedindo que este ocorra mediante uma "programação rigorosa". O PAN exigiu uma reabertura adequada "à realidade de cada região" e o PEV vincou a importância de ela ocorrer "com planeamento".
Perguntas e respostas
No plano de desconfinamento, apresentado esta segunda-feira por especialistas a pedido do Governo, qual é o critério para se começar a desconfinar?
O matemático Óscar Felgueiras defendeu que as medidas só sejam atenuadas quando a incidência do vírus se situar abaixo dos 60 casos por 100 mil habitantes. A "linha vermelha" são os 240 casos por 100 mil habitantes.
De que forma irá ocorrer o desconfinamento?
A avaliação será feita através do estabelecimento de cinco níveis de risco à escala nacional. O nível 1 (risco muito baixo) atinge-se com zero casos. O nível 2 (risco baixo) verifica-se até aos 30 casos. O 3.º (médio) vai até aos 60 e o 4.º (alto) ocorre a partir dos 120. O nível 5 (elevado) é ativado ao atingir-se os 240 casos por 100 mil habitantes.
Também vai haver critérios a nível local?
Sim. A nível local, os patamares são quatro: moderado (zero casos por 100 mil habitantes), elevado (240), muito elevado (480) e extremamente elevado. Este processo de atribuição de risco avalia não apenas os valores por concelho, mas também os concelhos vizinhos, resultando num mapa mais homogéneo e onde será mais fácil perceber onde estão as zonas problemáticas.
Por onde e de que forma vai iniciar-se a reabertura do país?
Raquel Duarte revelou que as medidas do desconfinamento serão "faseadas" e começarão pelas creches. "Se abrirmos no nível 4, abriremos com o pré-escolar e o infantil" devido ao "baixo risco" que o seu funcionamento comporta, referiu a pneumologista. Se, "passadas duas semanas", a situação pandémica se mantiver estável ou decrescente, o plano permite "passar para o nível 3, com a abertura do 1.º e do 2.º ciclo, e por aí adiante", acrescentou.
E como se passará de um patamar para o outro?
Raquel Duarte esclareceu que uma eventual deterioração dos números não irá automaticamente reverter o desconfinamento: "Só o agravamento de dois níveis pode permitir que haja um retrocesso na implementação das medidas", afirmou. Já para haver uma descida para o patamar inferior, o risco tem de se manter estável ou decrescente.