No ano passado, os hospitais públicos enviaram 23% das interrupções de gravidez por opção da mulher para clínicas privadas, quase o dobro das grávidas referenciadas em 2019. O número total de abortos registou a maior queda em 15 anos, mas o último relatório da Direção-Geral da Saúde mostra que a redução foi muito mais expressiva no Serviço Nacional de Saúde do que no setor privado.
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O Relatório de Análise Preliminar dos Registos das Interrupções da Gravidez (2018-2021), publicado esta sexta-feira pela Direção-Geral da Saúde (DGS), revela uma redução acentuada do total de abortos por opção da mulher nos anos da pandemia.
Em 2020 realizaram-se 13 777 abortos por opção da mulher até às 10 semanas de gravidez e, em 2021, foram 11 640. Os dados são provisórios, como realça a DGS, mas apontam uma descida inédita face ao ano pré-pandemia (menos 919 abortos em 2020 e menos 3056 em 2021).
Olhando para as unidades de saúde onde foram realizadas as interrupções de gravidez (IG) por opção da mulher, percebe-se que a diminuição foi mais forte nas unidades públicas, o que estará relacionado com os constrangimentos verificados no Serviço Nacional de Saúde (SNS) naqueles dois anos.
Em 2021, as instituições públicas fizeram 7 868 IG por opção da mulher, menos 2749 do que em 2019 (redução de 35). No mesmo ano, as clínicas privadas realizaram 3772 IG por opção da mulher, menos 307 do que no ano pré- covid (menos 7,5%).
De igual forma, o relatório permite constatar que, em 2021, os hospitais públicos referenciaram 23% das mulheres para unidades privadas, quase o dobro das enviadas em 2019 (12,6%). Em 2020, os hospitais do SNS encaminharam 19,8% das mulheres para fazerem o aborto no setor privado.
"Relativamente aos anos de 2020 e 2021, a referenciação do hospital público para o setor privado aumentou cerca de 10 pontos percentuais entre 2019 e 2021", refere o relatório da DGS, sem apresentar qualquer explicação para o sucedido.
Lisboa e Vale do Tejo faz mais interrupções de gravidez do que todas as outras regiões juntas
O documento destaca que nas IG por opção da mulher "continua a verificar-se a tendência decrescente da última década" e que a região de Lisboa e Vale do Tejo continuou, em 2021, a registar a maior percentagem de abortos por opção da mulher (61%), seguida da região Norte (21%). O Algarve registou 7,3% dos abortos por decisão da grávida, o Centro 7% e o Alentejo 1,53%. Nas ilhas, a Madeira totalizou 1,3% e os Açores apenas 0,1%.
Segundo o mesmo relatório, o tempo médio de espera para realizar uma IG por opção da mulher manteve-se nos 6,4 dias (com uma mediana de 5 dias) e a idade gestacional mediana manteve-se nas 7 semanas.
Realça ainda que o procedimento mais utilizado de IG por opção da mulher continuou a ser o medicamentoso. Tal está diretamente relacionado com o método usado no setor público e no setor privado. Enquanto no SNS, 98% das IG por opção da mulher são medicamentosas, nas unidades de saúde privadas o procedimento mais utilizado é o cirúrgico (96%).
27 jovens com menos de 15 anos abortaram em 2021
No que respeita a idades, mais de dois terços (66%) do total de abortos voluntários foram realizados por mulheres nos grupos etários dos 20-24 anos, 25-29 e 30-34 anos. Em 2021, fizeram um aborto por opção 27 jovens com menos de 15 anos e 1001 com idades entre os 15 e os 19 anos. A mediana de idade da mulher que abortou por opção até às dez semanas manteve-se nos 28 anos.
Entre 2018 e 2021, indica o mesmo relatório, há uma tendência crescente da proporção de abortos voluntários em mulheres estrangeiras, tendo no último ano representado 26,4% do total de IG por opção.
Adesão aos contracetivos após o aborto é superior a 93%
O acompanhamento das mulheres após uma IG também é analisado, em particular no que toca ao uso de contracetivos que evitem novas gravidezes indesejadas.
Os dados da DGS mostram que "a adesão a um método de contraceção após IG manteve-se superior a 93%". E a opção por métodos de longa duração "manteve a tendência crescente da última década, situando-se entre os 32,3% e os 40%".