Depois da polémica em torno das declarações de Lula da Silva sobre o conflito na Ucrânia, o presidente do Brasil não fugiu, este sábado, à questão da guerra da Ucrânia e defende a mobilização de um grupo de países que se sente à mesa para negociar a paz com as duas nações. Sobre o apoio militar da União Europeia aos ucranianos, Lula da Silva entende que quem não fala de paz, está a contribuir para a guerra.
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Embora compreenda o papel da Europa, Lula da Silva não retira uma palavra ao que já disse sobre o conflito na Ucrânia e recusa fornecer armas ao país para se defender da invasão russa: "Se não fala em paz, você contribui para guerra", sustenta o líder brasileiro, que pede aos europeus que entendam, também, o posicionamento da nação que lidera. "A guerra não constrói absolutamente nada, só destrói".
"Faz tempo que o meu país tomou uma decisão: nós condenamos a Rússia pela ocupação e por ferir a integridade territorial da Ucrânia. Nós não somos favoráveis à guerra. O Brasil não quer participar da guerra, quer encontrar um jeito para encontrar a paz na Ucrânia", argumentou, ao início da tarde de sábado, Lula da Silva, ao lado do presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, durante o primeiro momento de conferência de Imprensa da visita de Estado do presidente do Brasil a Portugal. O chefe de Estado reconhece que não tem "experiência de guerra", mas, do seu passado como sindicalista, recorda "muitos movimentos sociais que se radicalizaram" e não souberam parar. É o que está a acontecer na Ucrânia, crê Lula.
"Os dois países não querem parar. Temos de encontrar um grupo de países que possam contribuir para que a guerra pare e sentar à mesa para negociar. Eu nasci, na minha vida política, negociando situações muito difíceis para o meu mundo sindical. É preciso que os dois países [Ucrânia e Rússia] confiem na interlocução, que pode ajudar a resolver o problema e encontrar uma solução para paz. O Brasil não quer participar da guerra, quer participar da paz", reiterou, certo de que é melhor encontrar uma saída para o conflito "nas negociações" do que continuar a tentar uma saída "no campo de batalha".
"Se não fala em paz, você contribui para a guerra"
Perante a insistência dos jornalistas portugueses sobre se o líder do Brasil mantém a convicção de que a União Europeia está a contribuir para a guerra com o atual posicionamento e ao fornecer armas à Ucrânia, Lula da Silva começou por dizer que não estava a perceber a pergunta e, depois da tradução de Marcelo Rebelo de Sousa, afirmou que quem não fala de paz, está a contribuir para a guerra.
Lula da Silva deixou claro que não visitará nenhum dos dois países envolvidos neste conflito até que haja paz. "Eu não fui à Rússia e não vou à Ucrânia. Só vou quando houver uma possibilidade de paz. Eu acho que, agora, é preciso parar a guerra. Para parar a guerra, tem que ter alguém que converse. Se fosse possível resolver o problema teoricamente, a gente resolveria. Temos de convencer as pessoas a parar. A guerra não está a fazer bem à Humanidade. Não faz bem à Europa que tem problemas de energia, de fertilizante e de comida. Não faz bem ao Brasil que precisa de fertilizantes. É preciso encontrar um grupo de pessoas que esteja disposto a falar de paz, em vez de falar em guerra".
No entanto, o Brasil vai enviar um representante para conversar com Zelensky, mas ainda não há data para o encontro com o presidente ucraniano. Nesta sexta-feira, ficou a saber que o assessor para Assuntos Internacionais do ministro de Estado brasileiro, Celso Amorim, vai visitar a Ucrânia. A decisão foi tomada após uma reunião com a Associação de Ucranianos em Portugal.
"O Presidente Lula determinou e me orientou que dissesse à Associação de Ucranianos em Portugal que (...) Celso Amorim, que esteve na Rússia, vai visitar a Ucrânia", afirmou Macedo", anunciou, esta sexta-feira, o ministro de Estado, Márcio Macedo.
"Irritantes" não ficam para a história
Marcelo Rebelo de Sousa sublinhou as posições diversas de Portugal e do Brasil quanto ao conflito, mas argumenta que esse posicionamento distinto não afeta a comunidade portuguesa no Brasil nem a comunidade brasileira em Portugal nem belisca as ligações de passado, presente e futuro com o Brasil.
O chefe de Estado português relembrou que Portugal entende que "é justo permitir à Ucrânia defender-se e tentar recuperar território", ocupado pela Rússia. Quando ao papel do Brasil neste conflito armado, Marcelo insiste que cabe ao Brasil defini-lo. "Eu não me substituo ao presidente da República e ao congresso brasileiro. Isso compete às autoridades de cada país. Para Portugal, aliado da União Europeia e da Nato, a linha é uma. Para o Brasil, é a linha que o presidente Lula definiu", concretizou o presidente da República luso, que voltou a desvalorizar a divergência numa relação forte entre as duas nações.
"A posição portuguesa é diferente. Uma via para a paz pressupõe, previamente, o direito à Ucrânia de se defender e recuperar" o território que foi ocupado pela Rússia. E essa posição tem por base duas questões de princípio: a de "não beneficiar o infrator" e a de ficar claro que a violação de princípios e de valores de ordem internacional não é tratada de forma diversa consoante o poderio do violador.
"Portanto, o clima que esperava que existisse [nesta visita de Estado] é o clima que, inevitavelmente, que a história dirá, quando um dia for escrita. O que ficará para a história da visita do presidente Lula não foram os irritantes, foram as realidades estáveis e duradouras e essas serão sempre positivas", rematou Marcelo Rebelo de Sousa, no final de uma hora de conferência de Imprensa no Palácio de Belém.