Médicos propõem declaração do utente sob compromisso de honra para períodos curtos de ausência.
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A possibilidade de as baixas de curta duração (até três dias) serem emitidas pelo SNS24, ao invés do utente se dirigir a um centro de saúde, não está a ser bem recebida pelos médicos. O bastonário e os representantes dos médicos de família e de saúde pública defendem que a baixa só deve ser passada por clínicos. Para um período curto de doença, como uma indisposição, por exemplo, a melhor solução passaria por uma autodeclaração do trabalhador, que a entregaria à entidade patronal, sob compromisso de honra.
A proposta do grupo parlamentar do Partido Socialista (PS), em articulação com o Ministério de Saúde, tem como objetivo a redução da carga de trabalho nos centros de saúde, sobretudo quando estão em causa períodos curtos de doença e que não são remunerados. A declaração emitida pelo SNS24 não pode exceder os três dias consecutivos e só é usada até seis dias por ano.
Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, afirma que a "baixa médica é um ato médico", sendo um "equívoco" pensar que pode ser emitida por outros profissionais. Já Gustavo Tato Borges, presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública, aponta que o SNS24 é assegurado por enfermeiros, que não podem "atestar uma situação de doença".
"Transferir burocracia"
Apesar de agradado com a tentativa do Governo e dos deputados em aliviar a carga de trabalho nos centros de saúde, Nuno Jacinto, presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, acredita que "a confusão da burocracia será transferida para o SNS24". Tato Borges acrescenta que, se a medida for aprovada, terá de haver um reforço de profissionais no serviço.
Os três médicos ouvidos pelo JN concordam com a emissão de uma autodeclaração do utente, quando estão em causa períodos curtos de ausência do trabalho, por doença. "É algo que já é feito noutros países da Europa e tem resultado bem", justifica Miguel Guimarães. "Tem de haver responsabilização do cidadão e a definição de limites para proteger também os interesses das empresas".
Falta ainda clarificar um pormenor na medida, diz Nuno Jacinto. Não ficou "definido" se o utente terá de ligar para a linha do SNS24 ou se a baixa será emitida de forma automática, como ocorreu com as declarações provisórias de isolamento profilático. A proposta dos socialistas aponta que a solicitação seja feita por via digital. Fonte da direção executiva do SNS adiantou ao JN que a operacionalização será conhecida nos "próximos dias".
A proposta do PS será debatida e votada amanhã na Assembleia da República e está inserida na discussão sobre a Agenda do Trabalho Digno. Caso seja aprovada, a medida entra em vigor a 3 de abril.
Patrões sugerem experiência de um ano
A eventual emissão de baixas médicas de curta duração pelo SNS24 terá também impacto na comunicação entre os funcionários e as entidades empregadoras, pela "simplificação dos procedimentos", diz João Vieira Lopes. Para o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal ainda é cedo para avaliar a proposta dos socialistas, mas já foram feitas sugestões ao Governo numa reunião.
"Propusemos ser uma medida provisória durante um ano, para se saber se aumentou ou não o número de baixas". Em função da experiência e do respetivo balanço, seria "possível saber se é para continuar", acrescentou.
O diretor-executivo do SNS afirmou, em entrevista ao JN a 22 de janeiro, que a emissão das baixas de curta duração estava a ser discutida com a Segurança Social, tendo os patrões e os sindicatos sido auscultados também no processo. "Há locais em que um terço do trabalho é passado a emitir esse tipo de atestados, não traz nenhum valor acrescentado", disse.