A aritmética da guerra prossegue a curva infame, desvendada na sucessão de valas comuns, na exposição de corpos lançados sobre o asfalto, na ignomínia do ímpeto sádico de aniquilação apontado à massa coletiva de inocentes, sem intervenção direta no jogo maquinal do confronto. Os massacres em Bucha, a Noroeste de Kiev, Irpin e Gostomel, atiraram por terra ilusões de cumprimento de um quadro de normas internacionais que delimitam as regras da guerra. Na liquidada Mariupol, o município fala agora em mais de cinco mil mortos civis. Números atirados por alto, que a devastação da cidade estendida sobre o Mar de Azov não permite contabilizar o rastro de morte ocultado sob os escombros. E Zelensky, o irredutível, insiste no envio massivo de armas para a Ucrânia, na aplicação de sanções <a href="https://www.jn.pt/mundo/zelensky-pede-ao-ocidente-sancoes-dolorosas-para-a-russia-14749857.html" target="_blank">"realmente dolorosas"</a>, que verguem a voracidade da Federação Russa. O mesmo apelo que há-de repetir, 'ad nauseam', na intervenção, a partir de Kiev, no <a href="https://www.jn.pt/nacional/zelensky-ja-aceitou-o-convite-para-discursar-na-assembleia-da-republica-14750512.html" target="_blank">Parlamento português</a>, que deverá acontecer entre os dias 18 e 22 deste mês.
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Bruxelas corrobora e insistiu, esta quinta-feira, através do seu alto representante para a Política Externa, Josep Borrell, que a Ucrânia necessita de "menos aplausos e de mais armas", tendo defendido mais sanções contra a Rússia, incluindo no petróleo, que não figura no quinto pacote de sanções definido pela União Europeia. Palavras e intenções sopradas pelo chefe da diplomacia europeia antes do início da reunião interministerial da NATO, que defendeu ainda o isolamento de Moscovo na comunidade internacional e a sua expulsão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o que veio a confirmar-se ainda hoje, com a Assembleia Geral das Nações Unidas a votar a suspensão da Rússia do conselho sedeado em Genebra, que congrega 47 membros. O representante da Rússia, Gennady Kuzmin, condenou a votação, tendo sido apoiado, sem surpresa, por países como a Coreia do Norte e a Síria. Possíveis sanções adicionais serão discutidas na próxima segunda-feira no Conselho de Ministros dos Negócios Estrangeiros, no Luxemburgo.
Em Estrasburgo, o Parlamento Europeu apelou hoje a um "embargo total" da União Europeia às importações de matérias-primas energéticas da Rússia. Numa resolução aprovada com 513 votos a favor, 22 contra e 19 abstenções, os eurodeputados insistiram na aplicação de medidas punitivas adicionais, incluindo "um embargo total imediato às importações russas de petróleo, carvão, combustível nuclear e gás", que deve ser acompanhado de um plano para garantir a segurança do aprovisionamento energético da UE. Os eurodeputados votaram ainda um pedido de exclusão da Rússia do grupo do G20 "e outras organizações internacionais".
A marcar a política nacional esteve, esta quinta-feira, a apresentação, na Assembleia da República, do programa do Governo, com António Costa a anunciar um pacote de medidas para conter o aumento dos preços na energia e bens alimentares, que assenta em "quatro eixos fundamentais". Se nos combustíveis, o ISP terá uma descida "equivalente à redução do IVA para 13%", as famílias carenciadas serão apoiadas "a fazer face ao acréscimo de custo dos bens essenciais". "Iremos alargar a todas as famílias titulares de prestações sociais mínimas as medidas de apoio ao preço do cabaz alimentar e das botijas de gás", anunciou Costa, que se comprometeu ainda a "acelerar a transição energética", de modo a preparar o país para "crises futuras". Nos apoios à produção, o primeiro-ministro referiu que irá suportar "uma parte do aumento dos custos com gás das empresas intensivas em energia". Também os pagamentos fiscais e das contribuições para a Segurança Social dos vetores "mais vulneráveis", como a agricultura, as pescas, os transportes ou o setor social serão flexibilizados.
Na chegada à AR, Rui Rio revelou que o PSD se vai abster na votação da moção de rejeição do programa do Governo, apresentada pelo Chega. Considera o ainda líder do PSD que a mesma traduz "apenas um número mediático", sem efeito prático. Com maioria absoluta do PS no Parlamento, o chumbo está assegurado, pelo que a sua apresentação não representa mais que um gesto político.
Na imagem, uma linha sinuosa de crucifixos em campo aberto, de onde pendem vestidos de cores vibrantes. No cimo da colina, um arco-íris que rasga o céu carregado de chumbo. A imagem, assinada pela fotógrafa freelancer Amber Bracken para o The New York Times, traduz, numa subtil metáfora visual, a morte de crianças indígenas na "Kamloops Indian Residential School" - instituição criada no Canadá para assimilar menores de comunidades indígenas, num exercício de obliteração da sua cultura e identidade, e onde foram encontradas 215 sepulturas não identificadas -, e é a grande vencedora da edição deste ano do World Press Photo. O mais importante concurso mundial de fotojornalismo, que anunciou hoje o lote de premiados, eleva a Foto do Ano, e pela primeira vez nos seus 67 anos de história, uma imagem sem qualquer figura humana, onde a violência e a morte não se apresentam na crueza, às vezes indigna, do corpo exposto, mas no imenso vazio de um vestido que um dia serviu uma criança.
