João Galamba demitiu-se, mas António Costa não aceitou. Esta terça-feira foi frenética, depois de um fim de semana prolongado que para as bandas do Governo foi de tudo menos de descanso. O ministro das Infraestruturas estava no ponto de mira depois das últimas revelações na Comissão Parlamentar de Inquérito da TAP, mas foi uma noite, que até pancadaria meteu, que terá precipitado a sua intenção de deixar o executivo
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O verão que vem aí afigura-se como quente. Muito quente mesmo, como voltou a confirmar, esta terça-feira, o Instituto Português de Mar e da Atmosfera. Mas é nas asas da TAP que o país atravessa, diariamente, poços de ar e uma turbulência que já superou qualquer previsão.
A demissão de Galamba foi anunciada ao início da noite desta terça-feira, depois do primeiro-ministro, António Costa se ter reunido durante 1.40 horas com o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Parecia tudo resolvido, mas António Costa acabou por trocar as voltas a todos os cenários aventados, ao não aceitar a demissão.
João Galamba nunca foi consensual. Desde a sua nomeação para ministro das Infraestruturas que as críticas começaram, devido às polémicas em que esteve envolvido. Ao longo do seu percurso político no PS e no Governo, João Galamba, próximo de Pedro Nuno Santos e que pertencia ao grupo dos "jovens turcos", tal como Pedro Delgado Alves e Duarte Cordeiro, foi próximo de José Sócrates e apoiou a ascensão de António Costa no partido. A novela em torno da demissão do seu adjunto no Ministério das Infraestruturas foi apenas o último episódio. Recorde essa controvérsia aqui.
Steven Spielberg realizou, na década de 1980, a comédia "Um dia a casa vem abaixo". Um título que, só por si, já faz lembrar muito do que o país está a viver. Só que, no filme, o jovem casal que comprou a habitação adivinhava que as coisas não iam correr bem, que havia sinais de degradação dos materiais. No caso do Governo, a sensação é que tudo já começou mesmo a cair.,
A verdade é que esta sucessão de casos que abalam o Governo já vai com mais de meio ano. Num executivo que tomou posse há 14 meses... No entanto, após um período particularmente intenso nos últimos meses de 2022, parecia que a poeira tinha, por fim, assentado. Mas não.
Também Albert Uderzo e René Goscinny, criadores dos famosos livros de Astérix e Obélix, atribuíam ao chefe da aldeia gaulesa a certeza que o seu único receio era que o céu lhe caísse em cima da cabeça. "Mas amanhã não será a véspera desse dia", dizia o velho líder, de bigode branco. António Costa quiçá gostasse hoje de ter a mesma convicção que a personagem da banda desenhada.
E ainda na onda de evocações, recordemos "Angústia para o jantar", livro da autoria de Luís de Sttau Monteiro. A lembrar, neste caso, a declaração ao país de António Costa, já perto das 21 horas. A mesma onde pediu desculpas ao país pelos lamentáveis incidentes ocorridos no Ministério das Infraestruturas, na última semana, mas em que disse não poder prescindir de um membro do Governo que deu provas da sua valia.
O "dia Galamba" foi tão preenchido que pouco se falou de outros temas. Exceção talvez às também águas muito turvas que continuam agitar a Igreja católica. O antigo ministro da Justiça Laborinho Lúcio, que integrou comissão que estudou os abusos sexuais de crianças na Igreja, disse, esta terça-feira, que o facto de alegados abusadores já terem morrido não dispensa aquela instituição de indemnizar vítimas.
E tanto se tem falado em TAP, que quase nos esquecemos de outros temas graves que têm assolado o país e, sobretudo, as já depauperadas bolsas portuguesas. Nesse sentido, o Ministério Público (MP) defendeu esta terça-feira, em tribunal, que "é muito mais provável a condenação" de Ricardo Salgado "do que a sua absolvição", reiterando que este tem mesmo de ser julgado pelos 65 crimes de que está acusado no processo principal da queda do BES/GES, incluindo um de associação criminosa e 12 de corrupção ativa no setor privado.
Boas leituras e fique atento ao JN. Os próximos dias prometem mais atravessamentos de zonas de turbulência. Ou não fossem de TAP e de aviões que as notícias vão marcando este ano de 2023, que ainda nem a meio chegou.