"Tenho de falar com Putin", acaba de dizer Volodymyr Zelensky, o presidente ucraniano, "será a única forma de parar a guerra". Mas o pior da guerra está para vir, avisou hoje o presidente francês Emmanuel Macron, depois de falar com Vlamidir Putin. Hoje é o oitavo dia da guerra. Quantos já morreram, quantos já fugiram? "A Ucrânia ainda não morreu", diz o seu hino desde 1862.
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O mapa é um lobo, um jovem lobo dos Cárpatos, o lobo está em fuga, o seu lombo está a arder. A imagem revela-se como um estereograma desde o dia 24, o dia zero da guerra da Rússia sobre a Ucrânia que nos faz focar o mapa no infinito e ver um animal macerado. A cabeça do lobo aguça-se sobre a Polónia, Eslováquia, Hungria e Roménia, o olho da cabeça que vê a Europa é em Lviv; as patas da frente, que se movem para ocidente e batem na Moldávia, são a Odessa, a parruda; as de trás, que desde 2014 estão em sangue, são a Crimeia e sangram para o Mar Negro; a cauda que se agita em Donbass também está a arder; e todo o lombo do jovem lobo agredido está a ser bombardeado, as costas viradas para a Rússia a estrelejar, de Belgorod a Kharkiv até ao alto de Chernobyl.
É este o animal acossado: Ucrânia, uma jovem república da antiga URSS, desoprimida em 1991, que agora se encontra sob a pata do choque do pavor e da Rússia, um animal muito maior, um animal disforme, desproporcional, vasto e megascópico, um animal enlouquecido e tentacular.
Hoje é o 8.º dia da guerra. A segunda tentativa de cessar-fogo acaba de falhar.
A terceira ronda negocial que juntará russos e ucranianos ainda está por marcar.
"O pior pode estar ainda para vir", disse o presidente francês Emmanuel Macron quando desligou o telefonema vindo de Moscovo que o pôs a falar na manhã desta quinta-feira com Vlamidir Putin, o presidente russo, o agressor. A chamada foi pedida por Putin e Putin disse que a invasão "decorre como previsto" e que se os ucranianos não aceitarem a desmilitarização e um estatuto neutro pela via diplomática, a Rússia "ia conseguir estes objetivos através da via militar".
"Tenho de falar com Putin", acaba de dizer Volodymyr Zelensky, o presidente ucraniano, "porque é a única maneira de parar esta guerra". E Zelensky, que há muito que vê muito além do seu próprio horizonte, já vê evidentemente o mais mau: "Se desaparecermos, que Deus nos proteja, então [a seguir] será a Letónia, a Lituânia, a Estónia, etc... até ao Muro de Berlim, acreditem em mim".
E quem são, hoje, os países amigos de Putin? De cara descoberta são só quatro (Bielorrússia, Síria, Coreia do Norte e Eritreia), tantos quantos os que votaram, mais a Rússia, evidentemente, contra a resolução "Agressão contra a Ucrânia", no Conselho de Segurança da ONU. Mas há outros países amigos de Putin que escondem a cara e se abstiveram na condenação da agressão. São 35, incluindo a China, a Índia, Angola, Moçambique, Cuba, a Bolívia, a Nicarágua, a África do Sul, o Vietname, o Uganda, o Sudão, o Paquistão...
Alerta: esta guerra é uma ameaça real às centrais nucleares e a central ucraniana de Zaporizhzhia, a maior da Europa e uma das dez maiores do mundo, está já cercada pelos russos.
No sul, a cidade portuária de Kherson acaba de cair. Tem 290 mil habitantes, é o maior centro urbano capturado pelas forças russas desde que a invasão começou há oito dias.
Quanto gente já morreu? A guerra é obviamente uma guerra de números. A ONU já conseguiu confirmar a morte de 249 civis - mas serão já muitos mais. E militares? Ucrânia e Rússia mostram balanços totalmente divergentes: o lado ucraniano diz que matou nove mil invasores. Do lado russo, só se admite a morte de cinco centenas de soldados e contrapõe-se com a morte de 2870 guerreiros e "nacionalistas" ucranianos.
E quanto gente já fugiu da Ucrânia? Perto de um milhão - o Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, que lançou um portal exclusivo online para monitorizar o fluxo de fuga da Ucrânia, registou até agora 875 mil refugiados. E os refugiados são agora "um problema de todos na EU", disse esta manhã o ministro dos Negócios Estrangeiros Augusto Santos Silva.
Portugal continua a fazer o seu papel e pelo menos 40 refugiados virão neste autocarro, onde segue o jovem jornalista do JN Eduardo Fortunato, que hoje de manhã partiu de Braga em direção a Wroclaw, na Polónia, levando a bordo quatro motoristas e cinco voluntários, incluindo uma médica e uma enfermeira. O autocarro deve lá chegar no sábado, estará de volta a Braga, com os 40 refugiados ucranianos, no dia 7.
O Eduardo explicou-nos há pouco aquilo que está a ver e a fazer.
"A Ucrânia ainda não morreu", diz o hino da Ucrânia há pelo menos 160 anos, "nem morreu a sua glória, nem a sua liberdade". É um hino que comove, que se levanta. "Lutaremos de corpo e alma pela liberdade, somos irmãos Cossacos, manteremos a nossa integridade!".