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Em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão? O ditado popular encontra na atualidade vários factos que validam o seu grau de acerto. Dito de uma forma mais eloquente, quando os recursos são escassos e, obviamente, finitos, qualquer despesa corre o risco de ser avaliada como gasto excessivo ou, antes pelo contrário, como investimento reprodutivo e duradouro. Esse é o caso da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), cujo orçamento não pára de esticar e encolher ao sabor da acesa discussão no espaço público. Marcelo Rebelo de Sousa, sem dúvida um católico fervoroso que deve apreciar a vinda do Papa Francisco à JMJ, em agosto, veio dizer agora que "as entidades envolvidas estão a tratar de ver qual é a solução adequada para compatibilizar o sucesso dessa jornada com a situação que se vive no Mundo e também em Portugal".
Falando em recursos escassos, os sucessivos escândalos em torno da TAP, companhia maioritariamente pública, deverão merecer uma comissão de inquérito, uma vez que a proposta, nesse sentido, do Bloco de Esquerda será aprovada pelo PS na próxima sexta-feira. Esta quarta-feira, Mariana Mortágua, do BE, criticou o facto de a transportadora ter uma administração "paga a peso de ouro" e a viver um "regime de privilégio". Nesse sentido, lembrou não só os 500 mil euros de indemnização pagos à ex-administradora Alexandra Reis como, também, o "prémio milionário" de dois milhões de euros "escondido" no contrato da CEO, Christine Ourmières-Widener. Enquanto a TAP perde tempo com questões laborais dos quadros de topo, a concorrência não pára. A Ryanair anunciou mais 19 rotas e quatro novos aviões no Porto e em Faro.
O custo de vida acentua todas as polémicas que versam sobre o aparente mau dispêndio de dinheiros públicos. É verdade que inflação da Zona Euro recuou pelo terceiro mês consecutivo, estando em 8,5%. Em Portugal, os números do desemprego parecem pouco sólidos, indiciando uma possível reversão a qualquer momento. De qualquer forma, o Banco Central Europeu deve decidir-se, nesta quinta-feira, por um aumento da taxa diretora, seguindo, como sempre, o padrão estabelecido esta quarta-feira pela Reserva Federal norte-americana. É bem verdade que as taxas Euribor parecem já ter incorporado esse agravamento que afeta todos aqueles que têm empréstimos contraídos junto dos bancos.
Se os números gerais da inflação dão nota de uma eventual tendência de lenta descida, a verdade é que os gastos das famílias não serão positivamente afetados tão cedo. Os exemplos são mais do que muitos. Os preços das telecomunicações subiram 7,7% em Portugal enquanto na UE caíram 10% entre 2009 e 2022. As operadoras de telecomunicações Meo (Altice Portugal), Nos e Vodafone Portugal anunciaram o aumento do preço dos seus serviços até 7,8%, as duas primeiras a partir de fevereiro e a última em março.
A insatisfação quanto ao custo de vida resume-se numa ideia simples: salários baixos e desvalorizados não acompanham o aumento dos preços. Afeta todos, mas nesta altura os professores estão a dar nas vistas pela intensidade dos seus protestos. A inédita imposição de serviços mínimos nas escolas está a causar polémica, mas o Governo não parece disposto a recuar. O Ministério da Educação já respondeu às dúvidas colocadas pelos diretores. No documento, ao qual o JN teve acesso, a tutela esclarece que os serviços mínimos determinados pelo Tribunal Arbitral têm de ser cumpridos, "independentemente do número de pré-avisos de greve". Confirma ainda que cabe aos dirigentes escolares a convocação dos professores e funcionários. No setor educativo, os professores e funcionários têm muito a perder se não merecerem o apoio da socieade. "A simpatia da opinião pública pode virar-se contra os professores", avisa Marcelo Rebelo de Sousa.
Onde não parece faltar dinheiro é no mundo muito particular do futebol. Nesta quarta-feira, o movimento "Servir o Benfica", que concorreu contra Rui Costa nas últimas eleições, veio dizer que foi "enganado" e questiona o líder dos encarnados sobre se as águias foram ou não formalmente obrigadas a aceitar a proposta do Chelsea para contratar Enzo Fernández por uns estratosféricos 121 milhões de euros, 81 milhões dos quais vão para os cofres da Luz.
Fora dos relvados, o futebol continua a atrair elementos que nada têm a ver com o desporto. A PSP tem em curso uma operação de grande envergadura para dar cumprimento a 29 mandados de detenção relacionados com elementos dos grupos casuals, uma subcultura violenta das claques de futebol com afinidade ao Sporting e ao Benfica, em Lisboa e na margem sul do Tejo. Até ao momento, 27 pessoas foram detidas.