Marques Mendes. O viciado em política que quer ser presidente da República
Chegou a fumar 60 cigarros por dia, foi fiel a Cavaco Silva, liderou o PSD, entrou em guerra com históricos, é fervoroso benfiquista. Tenta seguir os passos de Marcelo para lhe suceder em Belém.
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Nunca esteve à frente nas sondagens, mas aos primeiros sinais de aproximação ao almirante Gouveia e Melo – que surge destacado em todas as amostras para a Presidência da República – Marques Mendes quase exultou. “É a indicação de que o caminho que temos tomado é o mais correto”, sustentou. Ainda assim, não larga o segundo lugar, embora continue bem colocado para uma possível segunda volta, o que não acontece em presidenciais desde 1986, no célebre (e renhido) combate entre Mário Soares (51,18%) e Freitas do Amaral (48,82%).
Nessa altura, Marques Mendes não completara 30 anos e já era membro do Governo, para o qual aceitara entrar após três insistentes convites de Cavaco Silva, o primeiro-ministro que o fez também porta-voz, além de secretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares.
“Uma mudança profundíssima do ponto de vista familiar”, assim lembrou numa entrevista a Anabela Mota Ribeiro. Casara-se com a tradutora Sofia Salazar, a namorada de sempre, aguardava o nascimento do primeiro filho, João Pedro – viria também a ser pai de Ana Sofia e de João Miguel, sabia que seria um ponto sem retorno. “Quando o conheci já tinha o bichinho da política, mas nunca pensei que fosse tão longe”, descreveu Sofia ao “Diário de Notícias”, em 2005.
Com Cavaco, foi ainda secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e ministro-adjunto, até 1995. Fumava 60 cigarros por dia, vício que largou de um dia para o outro quando um amigo próximo faleceu com cancro de pulmão.
Admirador de Sá Carneiro, dava os primeiros passos no curso de Direito na Faculdade de Coimbra quando, sob reserva do pai, o advogado António Marques Mendes (1934-2015), um dos fundadores do então PPD (futuro PSD) no Minho, se aventurou, em 1976, nas primeiras eleições autárquicas à Câmara de Fafe, onde vivia com a família. Acabou vice-presidente do município e acumulou com o cargo de secretário do governador civil de Braga, Eurico de Melo, o homem que o viria a aconselhar a Cavaco.
Em 1982, com 25 anos, foi indicado cabeça de lista da Aliança Democrática também a Fafe, mas não superou o histórico socialista Parcídio Summavielle (52,6% contra 40,59%). O resultado ainda perdura como o melhor de sempre conseguido pela principal força da oposição num concelho onde o PS apenas não conquistou uma eleição local em meio século.
“Tenho prazer em fazer política. Mas a vida não se esgota nela. Faço tudo isto com enorme desprendimento”, admitiu. O mesmo desprendimento com que foi guarda-redes de andebol, apesar da baixa estatura, 1,62 metros. “Não sou uma pessoa complexada”, garante. O mesmo desprendimento com que Marques Pentes, boneco que o representava no programa de sátira política “Contra-Informação”, da RTP, na década de 1990. Longe vão os tempos do andebol, mantém a ligação de sempre ao Benfica como adepto.
Voltaria a um governo em 2002, como titular dos Assuntos Parlamentares, a convite de Durão Barroso, para quem perdera a liderança do PSD dois anos antes.
Não desistiu da chefia partidária e conseguiu-a em 2005. Como líder dos sociais-democratas viveu tempos agitados, sobretudo quando excluiu das eleições autárquicas desse ano candidatos com problemas judiciais à perna, como os dinossauros Valentim Loureiro (Gondomar) e Isaltino Morais (Oeiras). “O Dr. Marques Mendes, cuja credibilidade dos outros coloca em causa, não olha para ele próprio nem se olha ao espelho. Ele não tem telhados de vidro, tem buracos no telhado”, acusou então o major à SIC. Apesar das polémicas, o PSD consegue mais municípios do que o PS e segura câmaras como a de Lisboa, com Carmona Rodrigues.
Dois anos mais tarde, cai-lhe nas mãos nova bomba. Carmona é acusado pelo Ministério Público de ter prejudicado os interesses (e os cofres) da autarquia lisboeta no negócio da permuta de terrenos da Feira Popular e Marques Mendes retira-lhe confiança. Lisboa vai a votos em intercalares, com o PSD a apresentar Fernando Negrão e a sofrer derrota copiosa para o candidato do PS, António Costa. Criticado internamente, convoca eleições diretas, que perde (43,1%) para Luís Filipe Menezes (53,6%).
Opta por se afastar da política ativa, dedica-se à advocacia, é consultor de empresas, escreve livros. Regressa à ribalta ao ocupar os domingos à noite, na SIC, como comentador político, a mesma tarefa que celebrizou Marcelo Rebelo de Sousa perante a opinião pública e o ajudou a catapultar uma candidatura à Presidência. Despediu-se dos telespetadores a 2 de fevereiro, dias antes de se apresentar oficialmente como pretendente a Belém. A cerimónia foi em Fafe, onde tudo começou.