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Não se vislumbram razões que impeçam a comemoração do 25 de Abril na Assembleia da República. Há um precedente, é certo, já que em 2011, também com o Parlamento dissolvido, a cerimónia foi deslocada para Belém. Trata-se de uma decisão política, uma vez que nenhum preceito jurídico ou regulamentar impede um consenso dos partidos para abrir a casa da democracia numa altura em que a Assembleia está limitada nos seus poderes.
No último ano viveram-se momentos turbulentos no hemiciclo, tanto que chegou a discutir-se a possibilidade de sanções a deputados que violem o Código de Conduta. A intolerância e o racismo, disfarçados de liberdade de expressão, sentaram-se descaradamente nas bancadas. A demagogia e o populismo fazem caminho, em Portugal como no mundo. Fragilizados e com dificuldade em construir pontes, os principais partidos têm dado uma imagem desconsolada dos poderes que nos representam.
Neste contexto, celebrar os princípios fundadores da nossa democracia é não apenas importante, mas vital. Não se trata de uma mera evocação, mas da necessidade de reflexão profunda, por parte dos partidos, sobre o papel que desempenham na sociedade. Sobre o serviço público que deveria sempre nortear a sua ação. E sobre a urgência de reabilitar a política como ação de alguns em função do bem comum.
Celebrar Abril é trabalhar todos os dias para cumprir as suas conquistas. Paz, pão, habitação, saúde, educação – o verso de Sérgio Godinho, tão entoado nas ruas, permanece atual na sua ambição. Abril constrói-se dia após dia. A liberdade traduz-se em políticas concretas. Que a sessão solene tenha palco no Parlamento, mas tenha sobretudo eco na campanha eleitoral e nas prioridades que os partidos venham a apresentar aos portugueses.