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A construção do próximo orçamento de longo prazo da União Europeia (UE), o chamado quadro financeiro plurianual, é transparente e aberta, tanto que até se pode aceder online ao painel de cidadãos europeus. Contudo, é um excelente exemplo de que não basta os mecanismos existirem para que as populações os utilizem. Para a maioria dos portugueses, o tema será inacessível e os partidos pouco se têm esforçado para o incluir na política doméstica.
Em cima da mesa estão, no entanto, mudanças profundas que vão ter consequências para as regiões mais debilitadas e despovoadas. Simplificando, são sobretudo duas as razões para que isso aconteça. Uma delas chama-se Defesa e tem estado na boca de todos os líderes. A necessidade de maior independência face aos EUA, mais ainda perante uma Rússia que poderá sair reforçada no seu apetite territorial, tem sido invocada para aumentar as verbas da Defesa tanto nos orçamentos nacionais como no financiamento europeu. Há até, entre os líderes dos 27, quem defenda que verbas não usadas do PRR e do atual quadro dos fundos de coesão devem ser de imediato redirecionadas para aquele setor.
Uma segunda razão está na prioridade traçada pela Comissão Europeia: melhorar a competitividade da UE. O que significa que os fundos são vistos como motor desse objetivo e não necessariamente como meio de ajudar as regiões que não conseguem ser competitivas. Dito de outra forma, é uma transformação que leva a que nos bastidores de Bruxelas se murmure, com todas as letras, que a coesão tal como a conhecíamos morreu.
Em teoria, usar os fundos para sermos competitivos está correto. Era isso que deveríamos ter feito nas últimas décadas. O problema é que apenas as regiões mais industrializadas conseguirão estar alinhadas com esse objetivo e as fortes assimetrias regionais exigem verbas dedicadas a princípios de convergência. Está o Governo empenhado na defesa dessa compatibilização entre as novas prioridades e as clássicas políticas de coesão? Está a Oposição atenta e disposta a valorizar este debate? O ideal seria que nos dissessem que visão têm para o território. Que pouco mais tem merecido de quem nos governa do que pontuais declarações de amor em jeito de notas de rodapé.