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Na sua raiz, a palavra empatia descende de um vocábulo grego que significava paixão. Percebe-se que a nossa identificação intelectual ou afetiva com o outro seja simples quando ele nos desperta paixão. O mesmo acontece com uma determinada ideia: é fácil aderir ao que nos cativa, nos entusiasma e nos preenche a alma. O exercício de entender o outro e de nos colocarmos nos seus sapatos torna-se substancialmente mais exigente quando tudo nele grita diferença e nos causa estranheza.
O espírito de Natal apela à compaixão e ao acolhimento de quem está em sofrimento e em perda. Convida a sentir as mais de 45 mil mortes em Gaza, ou a privação dos dois milhões de portugueses que vivem em risco de pobreza. Correndo o risco de simplificação, torna fácil o desafio a recordar os escombros que existem sempre sob o brilho das luzes. Mais difícil é transportar esse olhar atento e humano para o quotidiano, sem precisar que o Natal tente escavar o melhor que existe em nós. E mais difícil ainda perceber que não basta a empatia quando há confluência e concordância. Estamos profundamente carentes de abertura à divergência.
Com as mudanças cada vez mais rápidas no Mundo e os sinais de tensão e polarização que contaminam o quotidiano, a tolerância efetiva seria uma epifania bem-vinda no plano coletivo. Permitiria que tivéssemos menos preconceitos e desconfianças relativamente aos imigrantes, que aceitássemos a diversidade em todas as suas variáveis, que nos empenhássemos em eliminar sucessivamente o ódio e os muros que erguemos entre nós.
Obrigaria a abandonar a lógica de bolha e de rebanho para a qual os algoritmos tendem a empurrar-nos.
A empatia que procura entender o outro não é uma mera evocação da quadra. É uma escolha de alcance pessoal, mas sobretudo social e político. Tem consequências na forma como nos ouvimos, como lideramos, como definimos ações e prioridades políticas. Faz toda a diferença entre ficarmos fechados na redoma das nossas certezas, ou ativamente de braços abertos para um mundo em que todos contam na sua singularidade. Pessoalmente, não vejo mais universal presente.