Há alguns anos, bastavam duas fotografias e o bilhete de identidade. A criança dava uns pontapés na bola e, consoante o talento, era inscrita por este ou aquele clube.
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Os jovens divertiam-se e havia espaço para todos. A evolução natural faria depois com que cada um seguisse o seu caminho. Em muitos clubes, para além dessa janela de oportunidade, os jovens tinham direito a transporte (a gasolina não tinha os preços pornográficos de hoje) e, no final, havia ainda um lanche.
Passei por isso e só agora me apercebo da sorte que tive. Era (quase) tudo gratuito, como forma de colocar todos os meninos e meninas, os homens e mulheres de amanhã, a ter contacto com valores de espírito de equipa, união e entreajuda. Princípios que são mais-valias dentro e fora das quatro linhas. Hoje, isso acabou.
Esqueçam as fotografias e o bilhete de identidade. Os clubes que desempenhavam este papel deixaram de ter tantos apoios e abriu-se espaço para muitas escolas de futebol. Um negócio, uma máquina de fazer dinheiro. Agora, é preciso adquirir o próprio equipamento e pagar uma mensalidade, que, grosso modo, ronda uma média de 35 euros, conforme a quantidade de treinos. E ainda há a inscrição. Os pais, claro, sujeitam-se, em prol dos filhos. Afinal, toda a gente sabe que o desporto faz bem à saúde. Faz bem a tudo, menos à carteira.
No essencial, parece-me tudo errado. O desporto devia ser cada vez mais fomentado nas escolas e as crianças não deveriam passar tanto tempo sentadas numa sala de aula. Sobretudo, depois de uma pandemia que colocou as nossas crianças enfiadas nos quartos, atrás de ecrãs de computadores e telemóveis. Culpados? Há muitos, a começar pela máquina do Estado, que deveria garantir um acesso gratuito a qualquer tipo de desporto em idades de formação. Mesmo assim, somos campeões do Mundo e da Europa em modalidades como o futsal. São milagres com migalhas.
*Editor-adjunto