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Um tribunal administrativo francês anulou ontem a “licença ginecológica” que estava a ser aplicada regionalmente na Alsácia, desde setembro. A licença atribuía 13 dias anuais a funcionárias de serviços locais e regionais que sofressem de dores menstruais, endometriose ou sintomas de menopausa. A revogação da medida, por falta de enquadramento legal, reabriu o debate sobre a criação de um diploma próprio.
O tema é recorrente também em Portugal e, embora continue a não haver legislação específica, há empresas que adotaram programas nesse sentido. Em teoria, parece tudo certo: estaremos a criar condições para melhorar a saúde e minimizar o impacto que milhares de mulheres sentem na qualidade do seu trabalho. As experiências em países que já aprovaram a “licença menstrual” mostram que a realidade poderá ser, contudo, bastante mais complexa.
Ao invés de promover maior igualdade, a medida poderá reforçar a discriminação e a estigmatização da mulher, associando a ideia de absentismo e de fragilidade ao usufruto deste benefício. Outra consequência (ou risco, pelo menos) é o maior isolamento da mulher, paradoxalmente sem cuidados médicos adequados nas situações em que efetivamente precisa deles. Um melhor diagnóstico de sintomas incapacitantes e a aplicação de direitos idênticos aos de outras doenças crónicas poderá ser a resposta.
Mesmo que uma ideia em teoria promotora de igualdade não o seja necessariamente, o debate só por si é uma mais-valia. É preciso dar mais visibilidade a temas como a menstruação ou a menopausa, tantas vezes ainda rodeados de mitos e preconceitos, mas sobretudo à endometriose, que continua a ser desvalorizada. São questões de saúde pública, para as quais é preciso encontrar respostas igualmente públicas. Que não obriguem, ainda e sempre, a mulher a fechar-se em casa.