Corpo do artigo
O voto é um exercício de liberdade e é, deve ser, um ato de esperança. É o momento em que se faz a escolha das prioridades para o país e de quem melhor conseguirá assumi-las e concretizá-las. A lógica do voto útil subverte esse princípio e tenta convencer os eleitores de que só interessa votar em quem tenha possibilidade de vencer. É uma lógica que reduz opções, mais ainda para eleitores de distritos onde apenas dois ou três partidos conseguem entrar.
Se há algo que os últimos anos têm demonstrado é que insistir na estabilidade e na governabilidade é uma falácia. O último executivo socialista dispunha de maioria absoluta. O Governo liderado por Luís Montenegro viu viabilizado o programa eleitoral e o Orçamento do Estado e desperdiçou essa conquista em nome de uma clarificação que, muito provavelmente, deixará o Parlamento de novo fragmentado e não clarificará nada de essencial.
As eleições legislativas não servem (apenas) para escolher um primeiro-ministro. Escolhemos a configuração do Parlamento e é a partir dela que se desenha e emerge o Governo. Definimos, voto a voto, o peso de cada bancada. O peso de ideias concretas para a vida das pessoas. Mesmo que essas propostas sejam remetidas para a Oposição, tão vital para a saúde da democracia como o exercício do poder.
Não houve, nesta campanha, discussões profundas sobre os desafios do país. Talvez seja inevitável, em tempos de velocidade e fogo de artifício, que as ideias e os princípios sejam cada vez mais relativizados em nome do pragmatismo e da eficácia na comunicação. Em qualquer caso, inútil é apenas a falta de esclarecimento, o empobrecimento do debate ou a proliferação da intolerância, do ódio e de tudo o que ameaça a coesão social. De resto, todos os votos depositados nas urnas e exercidos em consciência são úteis.