Repensar e realinhar incentivos para aproximar universidades e empresas
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As instituições de Ensino Superior (IES) e as empresas desempenham papéis complementares que sustentam a inovação e a economia do país. As universidades consomem recursos para produzir conhecimento, e as empresas aplicam conhecimento para gerar recursos.
Esta complementaridade é tão desejável que a respetiva promoção mereceu medidas como a criação de laboratórios colaborativos empresa/universidade ou incentivos fiscais às empresas. Os resultados são visíveis, por exemplo, no crescimento do número de projetos de I&D e de patentes conjuntos. Contudo, importa questionar se os incentivos estão devidamente alinhados.
De acordo com o estudo recentemente apresentado por Chiara Aprea no encontro CIÊNCIA 2025, Portugal tem registado um retorno económico e social significativo dos resultados de investigação, mas há margem para melhorias. O país é considerado um “inovador moderado” a nível europeu, tendo melhorado a sua posição, mas o investimento em ciência permanece aquém dos três por cento do PIB e da média europeia.
Portugal destaca-se na atração de talento jovem e no crescimento do número de patentes. Mas quando essa produção é expressa em percentagem do PIB ou do número de residentes, os indicadores ficam abaixo da média europeia.
Verifica-se um outro facto: a fração de publicações científicas assinadas por autores do sector público e privado está entre as mais baixas do espaço europeu. Contudo, o apoio fiscal às empresas em I&D, em percentagem do PIB ou do número de habitantes, é dos mais elevados da Europa.
Não será um problema de qualidade global das IES. No Ranking QS mais recente, a média das IES nacionais, em quatro das categorias avaliadas, está entre as dez melhores da Europa, destacando-se o sexto lugar em “Research Impact”.
Estes elementos merecem reflexão. A produção científica nacional cresce em qualidade e impacto, mas a transferência efetiva desse conhecimento para o tecido empresarial não parece ter atingido patamares comparáveis. Há um desafio estrutural por resolver: conseguir transformar o conhecimento gerado pelas universidades em valor económico e social de forma consistente e sustentável.
Este desfasamento entre ciência e impacto económico, que também se verifica no espaço europeu, revela a necessidade de realinhar os incentivos, quer do lado das IES, quer do lado das empresas. Precisamos de consolidar uma cultura de colaboração que permita a Portugal afirmar-se, consistentemente, como uma economia baseada no conhecimento.
Há diversas formas de promover a proximidade ciência / economia. As zonas livres tecnológicas, as “testbeds”, criadas no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), os parques de ciência e inovação, as incubadoras municipais e intermunicipais e demais interfaces entre academia, indústria e sociedade, podem assumir maior relevo, promovendo um ecossistema de inovação mais coeso e eficiente.
Só com um sistema de ciência e Ensino Superior mais ligado à economia será possível consolidar um ecossistema de inovação capaz de gerar crescimento económico e produtividade. É a transformação do conhecimento em soluções, produtos e serviços com impacto real na sociedade que permite concretizar e sustentar o potencial transformador da ciência.
Vale a pena pensar nisso.