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Não está fácil sobreviver, caros amigos, não está. E o que faz o jovem Diogo contra isso? Talvez faça o que pode, talvez faça apenas de conta que faz qualquer coisa.
- Então faltou à outra sessão porquê?, perguntou-lhe a juíza.
- Simplesmente, não me lembrei.
- Ah, não se lembrou!
A juíza não acreditou, torceu o nariz, não se esquece um julgamento em que se é acusado de tráfico de droga, para vir uma semana depois ao tribunal puxado pelos colarinhos pela polícia. A juíza não acreditou que Diogo, simplesmente, não se lembrara de vir, e por isso faltara ao momento em que ele próprio era julgado, mas que podia ele mais dizer? Diogo ficou paradíssimo, à espera de mais perguntas, só calcava o chão de dez em dez segundos, entortando o magro pé direito.
Aos 22 anos, tem trabalhado em restaurantes da Expo, respondeu o rapaz. Mas o que conta para esta história é que a 2 de Janeiro de 2022, quando o ano começava faz esta semana dois anos, Diogo foi apanhado a vender canábis e MDMA, também dito ecstasy, lá para o Bairro dos Olivais, num prédio vigiado pela polícia como verdadeiro supermercado da droga, com horário completo de 24 x 24 horas e olheiros à porta. Isto é, vigias que vigiam a possível vigia da polícia! A sua acusação, no entanto, é apenas de tráfico de menor gravidade. E começou Diogo:
- Quanto a essa acusação de que eu estaria a vender, não concordo com isso.
- Então explique-se lá.
- Nessa manhã de dia 2, fui de facto a esse local.
Segundo ele, parava ali pela zona dos restaurantes da Expo um seu conhecido, jovem sem-abrigo, que lhe dissera que lá em cima nos Olivais havia um bom sítio para comprar, não para vender droga, porque ele já é consumidor há quatro ou cinco anos.
- Fui lá comprar, com todo o respeito, não conheço as pessoas.
O sem-abrigo também foi com ele, para o acompanhar. Os polícias dizem que entrou e saiu várias vezes do prédio, com clientes a fazerem o mesmo e, finalmente, que o capturaram quando ia a entrar para um táxi. Tinha consigo seis pacotes de haxixe e dinheiro. E para onde se dirigia Diogo nesse instante? Para o médico, claro.
- Eu vou ser sincero. Eu apanhei sarna e estava com uma enorme coceira.
- Mas antes disso, foi comprar estupefacientes... Está a rir porquê?
- Peço desculpa, disse Diogo, cerrando a cara como se fecha a porta de um carro.
Ele não estava a abordar pessoas na rua, como disse a polícia, ele tinha ido abordar pessoas dentro do prédio. Sobre a vida mais larga, que todos mais ou menos temos, Diogo contou:
- Não tenho a menor ligação com eles. Com os meus pais. Eles separaram-se e eu não tenho qualquer relação com eles.
Em casos destes, como é habitual, cai tudo em cima dos avós. Diogo diz que comprou 60 euros de droga e que os 190 euros que trazia ainda no bolso eram de um trabalho num restaurante, ele costuma andar com esse dinheiro na rua.
- E porque é que não o guarda em casa?
- Não confio na minha prima.
- Está-se a rir outra vez. Gostava de ter a sua capacidade de rir de situações graves, disse a juíza.
E quem não gostava? Diogo apanhou um ano e seis meses de prisão suspensa. A juíza sugeriu-lhe, quase maternalmente, para não se fazer um peso para os avós. Está na altura de decidir se quer ser um criminoso na prisão ou um homem livre.
Quem faz o que pode, a mais não é obrigado.