A Anita é cheia de medos, o Serra, o Bob e o Benny adoram mimos, o Ronny é o mais guloso, a Safira só quer uma velhice tranquila, o Salvador já merecia mais, depois de, há dois anos, ter sobrevivido ao trágico incêndio num abrigo em Santo Tirso, Lucas, Pateta, Jerry e Mateus nunca conheceram outra casa. São apenas alguns dos 14 cães e oito gatos que têm, até amanhã, para abandonar o abrigo da "Tarecos & Patudos" em Labruge, Vila do Conde.
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O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) admite que são bem tratados, mas diz que há risco de incêndio. A associação de proteção animal não se conforma.
"A veterinária municipal disse-me para soltar os gatos. Para quê? Para morrerem atropelados no dia seguinte?", atira Liliana Oliveira, sem conseguir conter as lágrimas. É a presidente da "Tarecos & Patudos" e, por estes dias, mal dorme.
O abrigo, numa pequena zona florestal entre campos de milho, foi construído a pulso, há quatro anos e meio, com a ajuda e os donativos de voluntários: jaulas, "parque de diversões", recreio, uma "casa" para os gatos. Liliana fez-lhes um baloiço e as "caminhas". Pendurou-lhes fios e brinquedos. Anita e os outros "patudos" todos os dias passeiam, brincam ao ar livre e comem patê. Há fossa sumidoura, água do poço, limpeza diária.
A maioria dos animais veio da rua. Foram abandonados, maltratados, agredidos, mas também há histórias dos que chegaram pela mão do canil municipal, quando não havia espaço no abrigo camarário. O espaço é mantido por mãos voluntárias. A associação reconhecida pela Câmara e com subsídio anual. Durante quatro anos, tudo correu bem.
"Um pesadelo"
Em abril, a "Tarecos & Patudos" recebeu a visita do ICNF, do Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) e da veterinária municipal. Havia, explicaram-lhe, uma denúncia de maus-tratos. Liliana abriu as portas, sem medo.
"Concluíram que os animais estavam todos excelentes, mas estas construções eram todas ilegais [jaulas] e havia risco de incêndio", conta. Teriam que sair até setembro. O abrigo está em terreno privado, propriedade do tesoureiro da associação, mas nem isso lhes valeu. A Câmara prometeu ajudar, mas um novo terreno para que a associação pudesse prosseguir o seu trabalho, levaria seis meses a um ano. Até lá, tentariam arranjar adotante ou família de acolhimento temporário para todos.
No dia 15, tudo se precipitou. Liliana foi notificada no trabalho: afinal tinha que sair já. Tinha 5 dias. Pediu mais uma semana. Diz que foi a veterinária municipal quem recusou. Têm que sair até amanhã. Os animais serão retirados e distribuídos entre o canil e três associações da Póvoa de Varzim, Matosinhos e Maia.
"As adoções responsáveis estavam a correr muito bem. Tenho cães que não são sociáveis. Se vão para o canil, vão ser abatidos", diz, entre lágrimas, Cátia Oliveira, a vice-presidente da associação. A "Tarecos & Patudos" lamenta que "se implique com quem só quer ajudar", não entende o argumento do "risco de incêndio" e só pede mais uns dias para tentar encontrar uma família para todos