A pouco menos de dois anos de comemorarem o centenário, os Bombeiros Voluntários de Ermesinde, do concelho de Valongo, continuam a respirar vitalidade e a apostar na formação como garante da sustentabilidade da corporação.
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A Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Ermesinde foi fundada a 1 de junho de 1921 graças à iniciativa de alguns homens da região e na altura em que o país se procurava reerguer das consequências da 1.ª Guerra Mundial. Com apenas uma corporação no concelho, instalada em Valongo, a distância entre as duas cidades e os acessos difíceis tornaram imperativa a criação de um outro corpo de bombeiros para dar assistências às populações de Ermesinde e Alfena.
Ao longo dos anos, a associação foi cativando cada vez mais elementos para as suas trincheiras e, atualmente, conta com 96 elementos no corpo de bombeiros, aos quais se juntam os 14 estagiários de bombeiros e os 43 jovens da escola de infantes e cadetes com 43 miúdos e miúdas. "Serão estes os nossos futuros bombeiros. A nossa grande aposta é na sustentabilidade humana do corpo de bombeiros", começa por explicar o 2.º Comandante Emanuel Santos, que exerce funções de comandante em regime de substituição nos B. V. Ermesinde, reconhecendo que, hoje em dia, é mais difícil cativar os jovens para esta nobre missão.
Por isso, salienta que para se ser bombeiro voluntário "em primeiro lugar tem de ter muito tempo livre, aliado à vontade de querer ajudar". "O cidadão não deve ir para os bombeiros para ganhar alguma coisa, mas sim com a ideia de que vem ajudar e ciente de que vai perder muito tempo", alerta o responsável pela corporação, ressalvando: "Com o tempo vai perceber que esse tempo não vai ser tempo perdido, vai ser considerado tempo ganho. Quando conseguimos ajudar alguém, sentimos-nos bem, quando o nosso melhor não chega, é frustrante. Mas ser bombeiro é saber lidar com isso".
"Ao vir para os bombeiros, numa primeira fase é perder muitas horas com a instrução e, a partir daí dedicar algum do seu tempo livre a esta atividade. É importante que ele se sinta feliz a nível familiar e na outra atividade profissional. Vamos tentar, dentro das nossas possibilidades, fazer uma gestão de horário que lhe permita ser bombeiro, ser pai e marido e ser funcionário de uma empresa. É difícil, mas com a ajuda de todos conseguimos, desde que haja uma boa articulação entre o bombeiro e o seu comando", complementa Emanuel Santos.
A decisão de ingressar no corpo de bombeiros deve ser bem ponderada, pois a formação é dispendiosa para a corporação. "Sem estar a avaliar o tempo, que não é quantificável, cada bombeiro depois de estar formado fica-nos em média por 2500 euros, isto sem exageros de equipamentos, sem irmos aos topos das marcas. Entre equipamento de proteção individual urbano, o florestal, o uniforme número 3, que é o que nos permite andar pelo quartel e fazer serviço, fica por esse valor cada um", assinala o 2.º Comandante, referindo que embora o recomendável seja ter um fardamento completo por cada elemento da corporação tal não acontece e enumera as razões: "O número mínimo deve ser o do número de bombeiros que temos no quartel. Contudo, o equipamento tem desgaste, depois é difícil substituir devido ao custo elevado. O que vamos fazendo é, aos poucos, tentando adquirir um por outro".
"A Câmara Municipal de Valongo está-nos a apoiar na aquisição do equipamento de proteção individual florestal para as novas recrutas. Este ano, no 5 de outubro já nos entregaram oito quando tivemos promoções e o compromisso deles é que irão, sempre que possível, atribuir esse equipamento aos bombeiros do concelho quando são promovidos a bombeiro de 3.ª categoria. O que nos daria jeito era o equipamento de proteção individual urbano, que custa três vezes mais. Neste momento só conseguem ajudar a financiar o florestal e já é um passo e vamos caminhando a ver se conseguimos, com o tempo, que a atribuição e a ajuda sejam maiores", refere.
A falta de financiamento, ou melhor, o financiamento muito reduzido é o grande obstáculo e também desafio de quem gere os destinos da corporação de Ermesinde. "Recebemos uma pequena parte de um valor da Autoridade de Emergência e Proteção Civil, um subsídio municipal atribuído pela Câmara e tudo o resto são protocolos que temos tido, como com o INEM, que permite ter uma ambulância operacional oito a 10 horas por dia, embora consigamos ter três por dia. É um esforço muito grande feito pela gestão da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Ermesinde, que não se limita a gerir e tem de angariar verbas para poder gerir", anota Emanuel Santos.
E continua: "Com a subida dos preços de tudo, seja do combustível ou materiais, e sem a subida dos apoios não é fácil manter uma associação com a qualidade e o número de serviços que a nossa tem operacionais. Gastamos uma média de 6000 euros por mês de gasóleo. Somos uma instituição privada de utilidade pública, mas pagamos a energia elétrica e a água ao preço que o comum cidadão paga. Como se vê pelo tamanho deste quartel a energia elétrica, apesar dos esforços que fazemos - e a nossa iluminação é quase toda em LED e com sistema inteligente para só acender quando alguém está a passar -, mesmo assim ultrapassa os 2000 euros de fatura mensal. É uma fatura muito pesada".
Para fazer face às despesas elevadas e continuar a garantir a sustentabilidade da corporação, é necessário encontrar fontes extra de receita, o que vai sendo conseguido com a aluguer de algumas salas de formação, que lhe permitem ir pagando as contas. Também as ações de formações externas nos cursos de suporte básico de vida e suporte básico de vida pediátrico e de combate a incêndios com extintores contribuem para reduzir a despesa.
"Desde outubro do ano passado que somos uma entidade credenciada para dar formação. Estamos a entrar agora no mercado e a angariar algumas verbas com esta atividade. Mas não queremos ganhar muito com a formação, a ideia de investirmos na formação foi para ajudar na sustentabilidade do corpo de bombeiros, mas também auxiliar a população. Os nossos preços são mais reduzidos pois estamos a ajudar a população a ajudar-nos", avança o comandante em exercício, explicando: "Se um cidadão souber usar um extintor está a impedir a progressão de um incêndio e ao chegarmos o risco para nós é menor, tal como o trabalho e as despesas para o cidadão serão menores. Estamos todos a ganhar com isso. Na área dos primeiros socorros, no curso suporte básico de vida já formamos duas a três centenas de cidadãos da nossa área que se inscreveram, estamos a cobrar muito menos porque todos nós bombeiros somos potenciais vítimas, qualquer um de nós poderá ter um problema cardíaco ou qualquer situação e, se tivermos à nossa beira alguém que possa ajudar, todos estamos a ganhar com isso. Não estamos a ganhar apenas a nível financeiro, mas a nível de conhecimento e a nível humano".
Emanuel Santos anota que as valências dos B. V. Ermesinde são quase as mesmas de qualquer corporação: a extinção de incêndios, o socorro a doentes e feridos, o desencarceramento e a emergência médica.
Mas o que distingue, então, este corpo de bombeiros dos outros? "Apostamos muito na sensibilização e cidadania. Estes miúdos que estamos agora a formar são uma valência muito grande a nível humano, seja para o corpo de bombeiros, seja para informação que passam para os amigos na escola e familiares em casa, porque eles aprendem o que não é ensinado nas escolas: o trabalhar para a equipa, o espírito de grupo, o ajudar os outros, o saber ajudar e a satisfação que traz ajudar os outros. Aqui conseguem ter noção destas coisas. Conseguem praticar o que é ser bombeiro e conseguem praticar o trabalho em equipa e saber que um só não é nada. Nós apenas valemos pelo que somos em equipa".
Para ajudar a equipa a ser mais eficaz na sua missão, a corporação dispões de vários meios: seis ambulâncias de socorro, veículos de combate a incêndio, veículo escada, veículos tanque para acompanhar o combate e veículos florestais ajustados à área de atuação dos B. V. Ermesinde, ambulâncias de transporte de doentes e um veículo de desencarceramento.
"Temos os meios suficientes para o nosso corpo de bombeiros. Um que nos tem ajudado muito é o de desencarceramento, pois é um dos poucos existentes no distrito e tem uma valência muito grande: a grua. Permite remover um veículo de cima de outro ou de uma pessoa em dois minutos, o que é muito mais rápido que outras técnicas de desencarceramento. Financeiramente é um carro que nunca entra dinheiro com ele, só sai, mas pode salvar vidas e a vida humana é o mais importante", finaliza Emanuel Santos.