É dos estabelecimentos mais antigos do género na cidade do Porto e sofreu vários reveses que quase lhe ditaram a morte. Fundado em 1903, o café A Brasileira quer recuperar os eventos de índole cultural.
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"Quatro de maio" é o nome de um bolo. Feito à base de frutos secos e sem açúcar, está entre os símbolos de um dos cafés mais antigos do Porto. Transpondo para o dia de hoje, é a data que assinala os 120 anos d'A Brasileira. O espaço onde dantes se conspirava contra o regime e agora se pode comer um prato de tripas prepara-se para voltar a acolher eventos de índole cultural.
Símbolo por excelência continua a ser o café, na sua dupla dimensão: aquele que se bebe e aquele que se aprecia, enquanto sítio preservado que dá a conhecer como era A Brasileira em 1903. Foi ali que um emigrante regressado do Brasil, de seu nome Adriano Telles, começou o hábito de servir café aos clientes que apenas iam comprá-lo para tomar em casa.
De estabelecimento modesto, o café A Brasileira passou a ser um marco da cidade. Mas não sem sofrer alguns reveses que quase lhe ditaram a morte: chegou a estar fechado, a mudar de nome e a ser alvo da cobiça dos ladrões, até que renasceu, em 2018, fruto de uma parceria entre o empresário António Oliveira, que o comprou, e o grupo Pestana Hotel, que assegura a gestão.
Ocupa agora uma área mais pequena, com passagem direta para o restaurante também gerido por aquele grupo empresarial, que fez nascer um hotel no prédio, há cinco anos. Mas há coisas que não mudaram, como a origem do café e o facto de a torrefação ser concluída no local. E continua a ser possível comprar café para levar.
Situado na Rua de Sá da Bandeira, colhe desde sempre o benefício da centralidade. E também da existência de uma série de casas de espetáculos nas proximidades, desde logo os teatros. Por isso, A Brasileira só fecha à meia-noite.
Tudo somado - e tendo em conta um passado também marcado pela presença de intelectuais da cidade -, A Brasileira tem como objetivo "resgatar essa parte cultural", ainda no decorrer deste ano. Quem o afirma é Bruno Ribeiro, diretor de operações para a área do Porto do Pestana Hotel Group. Ou seja, "recuperar a dinâmica dos eventos", diz o responsável, dando como exemplo as tertúlias ou o lançamento de livros, a dinamizar em parceria com agentes culturais.
Bruno Ribeiro refere-se à Brasileira como um estabelecimento "totalmente consistente desde 2018" e onde é possível lembrar as "tradições e a cultura" da cidade até a nível gastronómico, pois ali é possível comer umas tripas, uns rojões ou um prego em prato.
"Há uma senhora que ainda vem cá lanchar quase todos os dias e tem perto de 98 anos", afirma, acrescentando que o café A Brasileira "é um reavivar do passado" para muitos dos clientes. O próprio lembra-se de, em miúdo, ir lá lanchar com a avó Olinda.
Com uma média diária de clientes a passar dos 100 e sem grande diferença entre o número de estrangeiros e de portugueses, A Brasileira vende à volta de uma tonelada de café por ano. Por ser dia de aniversário, hoje será reforçada a quantidade do bolo "Quatro de maio". E a quem entrar para consumir, será oferecido o café.
Por vários locais da cidade era comum ver-se o lema da casa. Escrita com a grafia antiga, como quando o espaço abriu, a frase "O melhor café é o d'A Brazileira" figura agora nos encostos das cadeiras.
Os avisos ainda lá estão, embora sejam desnecessários nos tempos que correm. "Por favor não cuspa no chão", pedia-se aos clientes que estranhavam o sabor amargo do café e se livravam dele de imediato.
Entre os que ainda estão abertos, provavelmente este café apenas é batido em longevidade pelo Porta do Olival, aos Clérigos, cuja fundação é apontada para o ano de 1853.