A Câmara de Valongo diz que a central fotovoltaica prevista para a União de Freguesias de Campo e Sobrado não cumpre o Plano Diretor Municipal e que os impactos paisagísticos e patrimoniais superam eventuais benefícios para o concelho. Este é o segundo projeto do género para a mesma zona ao qual o Município dá parecer negativo.
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Há mais um projeto em consulta pública - até 23 de janeiro, no Portal Participa - com o objetivo de implementar uma central solar fotovoltaica em Valongo, mais concretamente na União de Freguesias de Campo e Sobrado.
Segundo o resumo não técnico do Estudo de Impacte Ambiental (EIA) a meta passa pelo aproveitamento de energia solar para produção de energia elétrica, estando previsto que a central faça a ligação à subestação de Valongo, sendo para isso necessária a construção de um troço de linha elétrica aérea de média tensão de aproximadamente 2,7 quilómetros.
"A área de implantação do projeto, com aproximadamente 34,30 hectares (área vedada), desenvolve-se a norte/noroeste da povoação de Valongo e a este da autoestrada A41", lê-se no documento. A estimativa é de que sejam produzidos 45,389 GWh/ano de energia nesta Central Solar Fotovoltaica de Valongo II, proposta pela empresa Singular Sphere, Lda.
A Câmara de Valongo argumenta que este projeto não cumpre o Plano Diretor Municipal (PDM) e que "os impactos ambientais, paisagísticos e patrimoniais previsíveis sobrepõem-se aos alegados benefícios para o município", pelo que promete utilizar "os meios legais de que dispõe, nomeadamente munindo-se das normas que regem o PDM, tendo sempre em vista os interesses do Município e dos munícipes".
De acordo com o estudo elaborado pela Matos, Fonseca & Associados, entre os meses de setembro de 2021 e abril de 2022, haverá "impactes negativos" sobre a fauna e "impactes paisagísticos com significado", mas o documento destaca a importância económica do projeto. "Em primeiro lugar, o arrendamento das terras, o qual constitui uma renda fixa durante 30 anos para os proprietários e, em segundo lugar, um investimento de mais de 14 milhões de euros, fundamentalmente, através da captação de capitais externos, constituindo assim um impacte económico extremamente importante e significativo", refere o resumo não técnico, aludindo ainda ao facto de a produção de energia elétrica a partir de energia solar ir de encontro "à política energética nacional".
"Conclui-se que, embora se justifiquem algumas preocupações ambientais, estas serão francamente minimizadas pela adoção das medidas de minimização identificadas e propostas neste EIA, pela adoção de uma correta gestão ambiental na fase de construção do projeto, bem como pela monitorização prevista para a fase de exploração", sustenta o EIA.
O parecer da Agência Portuguesa do Ambiente, que consta do processo, indica que é um "projeto suscetível de provocar impactes negativos significativos no ambiente, pelo que se entende que deve ser sujeito a procedimento de avaliação de impacte ambiental". Pela proximidade à Paisagem protegida Regional Parque das Serras do Porto e à Zona Especial de Conservação (ZEC) de Valongo, esta entidade consultou o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas e a Associação de Municípios Parque das Serras do Porto, sendo que esta última mencionou que "um projeto desta envergadura implica impactes significativos" e que os painéis fotovoltaicos "marcariam indelevelmente um território que tem trabalhado e investido de forma muito evidente na promoção de infraestruturas verdes que valorizem a paisagem, o património e o usufruto sustentável da natureza".
Apesar de não ter sido contactada, a Câmara de Valongo enviou um parecer à APA em que aponta "impactes significativos, nomeadamente biológicos, hídricos, paisagísticos e patrimoniais" que podem "atingir significância muito elevada e caráter permanente, com a destruição de habitats e valores naturais e patrimoniais suplantando todos os benefícios do projeto".
Contactada pelo JN, a Autarquia de Valongo alega que esta proposta de central "não cumpre o que está preceituado no Plano Diretor Municipal (PDM) de Valongo". "Pela sua dimensão e localização, consideramos que este projeto põe em causa importantes valores patrimoniais do nosso concelho, nomeadamente estruturas mineiras de época romana, lousíferas e um geossítio", sustenta o Município.
"Este projeto é em tudo semelhante ao apresentado anteriormente e numa área praticamente contígua, o que amplia obviamente as consequências, nomeadamente no que se refere à fragmentação de habitats e aos valores patrimoniais", argumenta ainda a Câmara na resposta enviada, salientando também que este projeto "interfere diretamente com os percursos dos circuitos de Trail, de BTT e de Contemplação", o que inviabilizaria "a sua manutenção". A par disso, são "preocupantes os impactos na fauna e flora locais".
A implementação destas centrais, com esta "dimensão e duração", na proximidade do Parque das Serras do Porto e da Zona Especial de Conservação de Valongo, pode comprometer a estratégia de gestão ambiental. De acordo com a Autarquia também não é possível "prever adequadamente quais as medidas de recuperação ambiental e paisagística previstas após a fase de exploração, ou desativação da instalação, constituindo essa omissão um forte fator negativo".
"As energias limpas são o caminho, mas não pondo em risco o nosso património ambiental, nomeadamente da drenagem, impermeabilização, proteção e erosão dos solos, afetando a taxa de infiltração de água pluvial, ao criar uma barreira física que irá promover a escorrência superficial", dá como exemplo.
Recorde-se que este projeto é em tudo semelhante a um primeiro, relativo à Central Solar Fotovoltaica de Valongo I, cuja participação pública terminou e está agora em análise. Esse investimento, de 14,2 milhões de euros, abrange cerca de 51 hectares (área vedada), em terrenos contíguos, estimando os promotores que sejam produzidos 43,258 GWh/ano tendo como destino de ponto de entrega a Subestação de Fânzeres. A Câmara de Valongo já se tinha mostrado contra este projeto pelos mesmos motivos.
As empresas que propõem estes projetos, a Singular Sphere, Lda e a Compatiblespirit, Lda, têm ambas sede na mesma morada, em Sintra. Os estudos de impacte ambiental foram feitos também pela mesma empresa, a Matos, Fonseca & Associados.