Carris Metropolitana: "Voluntarismo político quis tudo a funcionar de um dia para o outro"
Fernando Nunes da Silva, professor catedrático, especialista em mobilidade, comenta a situação da Carris Metropolitana.
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O que é que falhou no arranque da Carris Metropolitana?
Há corresponsabilidade dos operadores, que não tinham capacidade para responder aquilo que o caderno de encargos exigia. Comprometeram-se com um grande aumento da oferta, o problema é que não havia motoristas nem autocarros. Com a pandemia e a guerra na Ucrânia, também houve empresas de construção de automóveis paradas e faltaram materiais.
A adaptação dos motoristas e passageiros foi difícil?
Os novos motoristas, nalguns casos, não conheciam bem os sítios em que estavam a operar e os passageiros é que diziam quais eram as ruas. Os utentes, sobretudo uma população que tem uma menor literacia, também demoram algum tempo a adaptar-se a novos itinerários e frequências. Grande parte da programação (horários) faz-se com base em modelos matemáticos e inquéritos e, normalmente, os que apanham os autocarros das 7 horas (mais afetados) ficam fora destes inquéritos.
O que se poderia ter feito de forma diferente?
Houve um voluntarismo político para pôr tudo a funcionar de um dia para o outro e, ao mesmo tempo, otimismo técnico a mais. Isso teve consequências bastante gravosas. Por ser uma alteração tão radical, do ponto de vista da geografia da oferta e do reforço enorme de serviços, eu seria mais cauteloso na mudança. Vai demorar algum tempo até conseguirem ter tudo em ordem, mas será corrigido.
Considera que a junção de várias operadoras numa só marca funciona?
Não tenho dúvidas. As redes que estavam concessionadas já não respondiam àquilo que eram as necessidades das pessoas, além dos custos completamente malucos, com pessoas a pagarem quase 200 euros por mês para terem acesso ao transporte coletivo. Agora, as novas zonas já foram delimitadas em função daquilo que são as grandes massas de deslocação, isto é uma melhoria enorme.
Há exemplos de sucesso lá fora?
Em Espanha, Barcelona fez isso há 20 anos e foram mais longe do que nós porque integraram tudo. Nós aqui deixamos de fora barcos, comboios, metro e elétricos. Lá foi muito mais difícil de se fazer e fizeram-no com três níveis de poder: municipal, Governo da Catalunha e Governo central de Madrid. E correu otimamente.