Falta consenso entre os autarcas da Área Metropolitana do Porto sobre a distribuição das despesas com os títulos de transporte e ainda sobre a criação da empresa metropolitana. Tanto que o líder do Conselho Metropolitano, Eduardo Vítor Rodrigues, suspendeu os trabalhos desta sexta-feira e abandonou a reunião.
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Todos pareciam estar de acordo, em julho passado, quando também numa reunião de Conselho Metropolitano do Porto foi discutida a criação da empresa metropolitana de transportes. O ponto foi aprovado, à data, por unanimidade, perspetivando-se o arranque do serviço daquela entidade com o da operação da nova rede de autocarros, Unir, prevista para novembro. Esse serviço inicia-se, afinal, em dezembro e, ao contrário do que aconteceu em julho, esta sexta-feira faltou consenso quanto aos estatutos da empresa metropolitana de transportes e gestão de bilhética.
A falta de entendimento entre os autarcas foi tal que o presidente do Conselho Metropolitano do Porto, Eduardo Vítor Rodrigues, suspendeu os trabalhos e abandonou a reunião, sendo cada vez mais palpável o afastamento entre os municípios.
"Havendo quórum e unanimidade, a deliberação é válida"
A discussão sobre a empresa metropolitana de transportes seguiu-se ao debate sobre a repartição pelos municípios das despesas de 2022 e 2023 do Programa de Apoio à Redução Tarifária (PART), - que introduziu o passe único na Área Metropolitana do Porto (AMP) -, e também foi motivo de controvérsia. Ambos os pontos foram adiados. O debate terminou até com o presidente do Conselho Metropolitano do Porto, Eduardo Vítor Rodrigues, a retaliar: "Não nos vamos fazer uns aos outros de otários". Isto, depois de a presidente da Câmara de Arouca, Margarida Belém, ter sugerido que a votação só poderia avançar se estivessem presentes todos os autarcas que constituem a AMP.
Em causa estava a proposta de dois modelos distintos de distribuição da despesa. "Qualquer dia estamos a pagar juros", alertou o também autarca de Gaia, depois de o presidente da Câmara de Gondomar, Marco Martins, ter sugerido que se defina um deadline para tomar uma decisão. Para Eduardo Vítor Rodrigues, "resolvia-se o assunto aplicando o critério da distribuição dos fundos comunitários ao PART".
"Por mim, podem arrastar o assunto até um momento em que, não tendo isto solução, dou o lugar a outro. É o que, muito provavelmente, vai acontecer. Não estou para isto. Na minha Câmara tenho tudo em ordem. Não venho para aqui para estar a dever há dois anos", admitiu Eduardo Vítor Rodrigues, que esperava pela chegada de um dos vice-presidentes do Conselho Metropolitano para poder dar continuidade aos trabalhos, já que tinha de sair.
Seguiu-se a intervenção de Margarida Belém: "Julgo que temos de estar todos para votar e tem de ser por unanimidade". A autarca referia-se a uma outra reunião em que, por ausência do Município do Porto, os autarcas decidiram não votar este mesmo ponto.
"Posso lembrar o que aconteceu? O que aconteceu, e acho que estão aqui pessoas que estavam presentes e lembrar-se-ão, foi que tínhamos um quórum absoluto, uma maioria absoluta, e faltava o Porto, «um dos proponentes do modelo [de repartição das despesas]. E nós, por uma questão de respeito, se o proponente não está e justificou com a visita institucional de um ministro, definimos não votar. Numa reunião fechada, depois, votámos tudo. Não teve nada a ver com a unanimidade dos presentes. Porque se é a unanimidade dos presentes, tenho de perguntar qual é a postura das pessoas que não põem os pés nas reuniões. Então hoje não é uma reunião deliberativa. Meu Deus. Não nos vamos fazer uns aos outros de otários", atirou o também autarca de Gaia, perante a ausência de pelo menos seis dos 17 autarcas.
Depois de um pequeno arrufo com Margarida Belém, ainda que a autarca tenha garantido um voto favorável, e também com o presidente da Câmara de Valongo, que disse não concordar com a proposta, o líder do Conselho Metropolitano afirmou, numa clara alusão à recente polémica com os apoios para as obras do Coliseu do Porto: "Não há consenso, não vamos votar. Não há consenso dos presentes. Porque havendo quórum, que fique muito claro, e havendo unanimidade, a deliberação é válida. Será levada até às últimas consequências. As impugnações fazem-se no tribunal".
Porto adiou votação para criação de empresa metropolitana de transportes
Com o adiamento dos pontos anteriores, foi lugar para discussão da criação da empresa metropolitana de transportes. "Não vale a pena estar aqui a maçar-vos com apresentações. Este ponto já foi até conceptualmente abordado em julho. Hoje é, provavelmente, o dia de rematar à baliza e, como digo, votaremos", apelou Eduardo Vítor Rodrigues.
De Valongo, José Manuel Ribeiro concordou com a votação, mas seguiu-se o vice-presidente da Câmara do Porto, Filipe Araújo, em substituição do presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira. "Não concordamos que seja votado hoje, até porque recebemos a maior parte da documentação hoje de manhã. Foi quando foi colocada na nuvem. Não temos qualquer informação sobre isto além da informação dos Transportes Intermodais do Porto (TIP). Esse é outro assunto, mas que não está vertida na composição da empresa, e, nomeadamente, um ponto que queremos ver salvaguardado, - se calhar está nos documentos mas ainda não sabemos -, que é a questão de como vai ser gerida a bilhética dentro da empresa metropolitana. Sem termos essa análise feita, não estamos em condições de votar", avançou Filipe Araújo.
Recorde-se, mais uma vez, que a operação da nova rede Unir deverá arrancar em dezembro e a intenção da AMP seria a de iniciar esse serviço em simultâneo com da nova empresa metropolitana de transportes. A administração dessa firma será garantida por uma pessoa da Câmara do Porto e outra da AMP, mas não foi anunciado qualquer nome.
"A questão do fee que a STCP paga está relacionada com os validadores, já que todo o sistema é dos TIP. Portanto, o Porto paga um bocadinho mais do que os outros por causa do aluguer. A partir do momento em que for liquidado os TIP [extingue-se com a criação da empresa metropolitana de transportes], os validadores passam para a STCP e vão pagar o mesmo fee que todos os operadores. Aquele valor que o Porto hoje paga mais, com a constituição da empresa vai pagar menos. No futuro, todo o sistema será da empresa e aí terá, de facto, de ser a firma a fazer o investimento e rever os fees. Neste momento, com a criação da empresa, o do Porto vai ficar mais baixo", garantiu a primeira secretária da Comissão Executiva da AMP, Ariana Pinho, em resposta a Filipe Araújo.
O esclarecimento não foi, contudo, suficiente: "Não tenho ainda esta análise feita, sinceramente, e não estamos em condições de votar. A questão que temos de avaliar é a de como vai ser gerida a bilhética dentro da empresa, sendo que não nos podemos esquecer que a STCP é a grande fonte de contribuição de bilhética [a Metro do Porto, entretanto, já ultrapassou a operadora] e, portanto, tem de estar salvaguardado que esse dinheiro também estará a financiar a STCP e não a financiar outro tipo de sistema".
Eduardo Vítor Rodrigues, por sua vez, afirmou que o problema da bilhética está resolvido. O presidente da Câmara de Gondomar, Marco Martins, insistiu também na resolução da questão das taxas: "Com a nova rede Unir, por exemplo, Gondomar não tem loja Andante. Queremos colocar uma máquina de venda no Souto e não podemos. Isso tem de ser resolvido, mas a questão de pagar a mais do que os outros está resolvida". Também o autarca de Valongo, José Manuel Ribeiro, voltou a mostrar concordância, recordando também o consenso já obtido anteriormente.
As intervenções não surtiram efeito. Filipe Araújo manteve a sua posição e Eduardo Vítor Rodrigues decidiu não esperar por nenhum vice-presidente. Deu os trabalhos como suspensos e abandonou a reunião.