Milhares de pessoas encheram as ruas do Porto e de Gaia para saudar Nossa Senhora de Fátima com alegria e lágrimas. A travessia do rio Douro, seguida por 30 embarcações, e a receção emotiva na Afurada marcaram o dia da despedida da imagem peregrina.
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Foi em 1947 que a imagem de Nossa Senhora de Fátima, recém-esculpida, se estreou na peregrinação pelas multidões de fé. A primeira viagem foi a Berlim, na Alemanha, de onde regressou de barco. Chegou ao Porto de Leixões a bordo do navio "Ribeira Grande". Este domingo, depois de percorrer 69 países e palmilhar milhares de quilómetros em terra lusa nos últimos meses, a figura alva e peregrina voltou a navegar. Desta vez, pelas águas calmas do rio Douro.
Um rio de emoções com milhares de pessoas nas margens, quer curiosos quer preenchidos pela fé que transbordava nas preces, nos sorrisos e nas lágrimas. Em dia da mãe e após a bênção dos estudantes finalistas da Academia do Porto na Avenida dos Aliados, a Virgem desceu num altar de rosas brancas ao cais da Ribeira (Porto), ladeada pelo bispo do Porto, D. António Francisco dos Santos, tocado pela generosidade dos "gestos de gratidão de tanta gente".
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No último mês, dias em que a imagem peregrina visitou a Diocese do Porto, D. António Francisco dos Santos reconheceu "entusiasmo, alegria e oração" nas multidões que têm acorrido à sua passagem. E recordou a alegria de levar "a imagem peregrina, de olhar terno e de coração materno da mãe de Deus", ao encontro de quem não consegue visitá-la em Fátima: os doentes, os reclusos e os idosos. "Reunimos os sem-abrigo na igreja do Marquês, que esteve cheia, e visitámos seis centros hospitalares e cinco estabelecimentos prisionais da nossa Diocese", relembrou o bispo, que guarda, com carinho, o "recado à mãe" cantado pela menina Inês Viterbo na Universidade Católica.
"Nossa Senhora ensinou-me a ouvir as súplicas e as preces, a agradecer os gestos de gratidão de tanta gente, colocando, no seu coração, tantas lágrimas que têm valor sagrado e sentido eterno", explicou D. António Francisco do Santos, já na viagem navegada para a Afurada, em Gaia, onde se viveu o momento mais emotivo do dia. Pouco tempo antes, na Ribeira do Porto, o bispo abriu caminho entre devotos e turistas, entusiasmados pela novidade.
Maria de Lurdes lá estava, entre os curiosos de telemóvel em riste e os católicos a abanar lenços brancos, para rever a Virgem. "A primeira vez que vi Nossa Senhora de Fátima no Porto tinha 18 anos", recorda. Hoje, longos anos depois, confessa a "felicidade" de tê-la na sua cidade. E, na Ribeira, viu-a subir ao barco que navegou até à Afurada.
Há muito que era esperada por 30 traineiras, pequenos barcos (a maioria de pescadores da Afurada) e um iate engalanados no Douro. Buzinas soltas, a multiplicarem-se na alegria da chegada da Virgem. E seguiram a trautear no rio, navegando lado a lado com a embarcação onde a imagem a todos vigiava. A fé sonora não se fez só de buzinas, mas também da alegria cantada, "Avé Maria", pelas mulheres a bordo dos barcos "O Predador" e "Belo Horizonte". Mas a entrada na Afurada foi de comoção.
Os pescadores, trajados com os casacos de xadrez que só vestem para carregar o andor de S. Pedro, multiplicaram-se em esforços para trazer o andor de Nossa Senhora de Fátima para terra. Foram mais de uma dezena de braços a garantir a segurança da imagem que, amparada pela força da fé dos pescadores, desceu pela estreita escada de metal do barco da Douro Azul até terra firme.
No porto de pesca apinhado de famílias comovidas, os homens que se revezaram no carregar do andor voltaram por três vezes a imagem para o mar, para que a Virgem abençoasse, com o olhar, a faina que se aproxima com abundância e segurança. Porque este domingo, finda a festa e depois de meses em terra, os homens da Afurada voltam ao mar alto para pescar.
As mulheres e as crianças atiraram pétalas, cantaram um hino a Fátima, lançaram balões brancos e rosas e suspiraram preces, muitas entre lágrimas, na certeza de ver a súplica concedida. "Deus, Nossa Senhora, já me abençoou", gritou uma das devotas, vestida de negro e de olhos fixos na Santa, "Ela vai ajudar-me". Por ali, os sonhos eram de um mar generoso e de uma vida com saúde.
Eduardo Vítor Rodrigues, presidente da Câmara de Gaia, acompanhou a imagem peregrina no percurso desde o Cais da Ribeira, no Porto, até a Afurada no dia da despedida da figura de Nossa Senhora de Fátima da Diocese do Porto. "Sabemos que o nosso país tem um culto mariano muito forte e, hoje, juntaram-se uma série de circunstâncias fantásticas: a imagem peregrina entra em Gaia no dia do encerramento desta peregrinação e no dia em que os pescadores da Afurada vai à faina. Do ponto de vista simbólico, está tudo reunido para que seja um bom momento para todos", assinalou o autarca, certo de que os pescadores, que seguiram a embarcação da Virgem "numa travessia extraordinária" pelo rio Douro, sairão para o mar alto com o "coração cheio".
E, da Afurada, a imagem de Nossa Senhora de Fátima partiu numa carrinha branca pela marginal ribeirinha, passando pela Avenida da República (com paragem no Município de Gaia onde os funcionários prepararam uma homenagem e depositaram uma coroa de flores) até à Rua de Conceição Fernandes. A partir daí, a subida até ao santuário do Monte de Virgem foi feita a pé, nos ombros dos homens, seguidos por uma multidão de devotos.
Depois da eucaristia, a imagem peregrina foi confiada à Diocese de Leiria e regressará a Fátima, estando preparada a sua entrada no santuário no próximo dia 13 de maio.