Depois de dois anos de interregno, devido à pandemia, cerca de 150 peregrinos saíram, esta quinta-feira, de Paredes, em direção ao Santuário de Fátima, com fé, alegria, ansiedade e saudades.
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É o primeiro de seis dias de uma caminhada, que muitos fazem por promessa e de forma repetida, onde se reza, se ri e se chora e que fica marcada pela emoção da chegada ao "Altar do Mundo".
Para que tudo decorra em segurança, a GNR está na estrada a sensibilizar peregrinos e condutores para os comportamentos a adotar.
"Os dois últimos anos senti-me triste, às vezes via coisas na televisão e até começava a chorar. Mas o grupo da peregrinação não ia e eu sozinha não podia ir", assume Maria Alice Marinho que participa na peregrinação da Associação Nossa Senhora dos Remédios - Obra de Bem Fazer há 14 anos. "Custou muito", afirma. "Custaram-me mais esses dois anos do que os outros anos todos", garante a mulher de 63 anos, de Amarante.
"Comecei a ir a Fátima a pé por causa de uma filha que foi operada às vistas. Prometi que enquanto pudesse ia. Sou uma pessoa de fé. O caminho para quem tiver fé é bom de fazer, para quem não tiver é mau. Para mim é bom. Durante o percurso, rezo, outras vezes choro, às vezes peço pelo mundo inteiro, desta vez peço pela paz", conta a peregrina.
Este é o início de percurso e, pela estrada, sozinhos ou em grupo, os rostos fazem-se de alegria.
Pela oitava vez, Manuel Vieira, de 71 anos, também pôs pés ao caminho."Comecei por ir por promessa e depois ficou-me esta vontade de fazer este percurso todos os anos. Andamos muito, essencialmente dentro de nós, e faz-nos bem", acredita o homem de Paredes. "Levo daqui o contacto com as pessoas e a ajuda e o exemplo que possa dar. Quando chego sinto-me bem por ter conseguido", reconhece, acrescentando que, também ele estava com "saudades" da peregrinação.
João Teixeira vai pela terceira vez a Fátima, mas já participou dois anos na peregrinação como voluntário. "Tenho fé, acredito na Nossa Senhora. Este percurso dá força, dá energia, dá vontade de ajudar uns aos outros", garante o paredense de 59 anos. É um caminho difícil, admite, e que traz "bolhas nos pés", e que gosta de fazer em grupo pela "segurança" que isso traz. "Foram dois anos maus. Estávamos ansiosos. Este ano há ainda mais vontade de meter pés à estrada", afirma, sobre o afastamento provocado pela pandemia.
Se há quem seja repetente, há também quem faça o trajecto pela primeira vez. Caso de Vera Silva, de Lousada. "Vim por curiosidade, pela aventura, pelo espírito e pelo que ouço os outros peregrinos a contarem da experiência", explica a jovem de 30 anos.
Não pela primeira vez, mas pela segunda, Lúcia Cunha, de 47 anos, segue no grupo. "A primeira vez vim por promessa. Desta vez, é um modo de agradecer a Nossa Senhora tudo o que me tem dado", diz a mulher de Lousada. "Este percurso traz muitas emoções, muitas alegrias, muitas amizades. Durante o caminho reza-se, canta-se, chora-se, faz-se um pouco de tudo. Quando se entra em Fátima esquece-se tudo o que se passou cá fora", garante.
A este grupo junta-se amanhã um outro, em Vila Nova de Gaia. No total, a Obra do Bem Fazer, de Paredes, vai dar apoio a cerca de 340 pessoas de vários concelhos, como Paredes, Penafiel, Marco de Canaveses, Amarante, Santo Tirso, Lousada, Paços de Ferreira, Vila do Conde, Póvoa de Varzim, Guimarães, Trofa, Maia, Vila Nova de Gaia e Aveiro. Na logística há 110 voluntários. Serão seis dias de peregrinação, divididos em etapas, e chegada está prevista para dia 10 de maio. "Vamos com alegria e fé. Tivemos dois anos tristes. Ando nisto há 30 anos. Fui dois anos a pé, e há 28 que dou apoio ao peregrino, desde o primeiro minuto da partida até ao último", refere António Paulino, presidente da Assembleia Geral da Obra e ex-comandante dos Bombeiros de Penafiel. Os peregrinos vêm por promessa, mas há também quem já faça este percurso "por desporto", pela experiência e pelo convívio, ainda que de forma emocional, reconhece. "Há sofrimento, há alegria e há o rezar todo o caminho" e a instituição apoia em tudo, desde as dormidas à alimentação até aos cuidados médicos e de enfermagem necessários.
Uma das voluntárias/peregrina é a enfermeira Isabel Oliveira, que tira férias e deixa o marido e os filhos para percorrer este caminho. Já tinha participado e voltou pelas "saudades". "Tinha a intenção de ir a Fátima e achei que seria mais útil, em vez de ir a pé, ir a acompanhar e pôr a minha profissão ao dispor dos peregrinos. Sou peregrina", explica. Assume que são seis dias complicados e de cansaço. "Mas quando um peregrino nos diz "obrigado" sabemos que é de coração", dá como exemplo. "Vou daqui com o coração cheio e com o sentimento de missão cumprida, sinto que cumpri a minha peregrinação a Fátima", realça a lousadense.
Entre as marcas que ficam estão as dos peregrinos que têm mais dificuldade em completar a jornada. "Às vezes parece que estão a desistir e eu sei que basta uma palavra amiga, dar ânimo e dizer vais conseguir, mais do que cuidados. Já cheguei a descer da ambulância e a caminhar junto deles", conta, dizendo que é gratificante ver que muitos vão buscar forças sem saber onde e conseguem chegar a Fátima, mesmo com os pés cheios de feridas. "Quando chegamos a Fátima, em procissão, é lindo. A vitória é do conjunto, somos uma família", conclui a enfermeira.
GNR sensibiliza
Até ao dia 15 de Maio, a GNR está na estrada, tendo reforçado o policiamento nas vias onde é esperada maior confluência de peregrinos. A meta é que todos cheguem em segurança, assume a capitão Carla Passeira, do Destacamento Territorial de Santo Tirso.
Com o levantamento das restrições pelo Governo, a Guarda espera mais pessoas a rumar ao Santuário e também mais tráfego nos acessos a Fátima.
Perante zonas com bermas e passeios reduzidos e até pouca iluminação, a GNR está a sensibilizar e a aconselhar os peregrinos a adotarem medidas para maximizar a segurança. Entre os conselhos estão "circular em fila indiana, com colete refletor, quer seja dia ou noite, sinalizar o início e o fim dos grupos, utilizar as bermas em sentido contrário ao fluxo do trânsito e não manusear telemóveis enquanto caminham", fazendo pausas em locais fora das principais vias, refere Carla Passeira. A presença dos militares visa também fazer com que os condutores "assumam uma condução mais prudente e reduzam a velocidade para evitar atropelamentos", acrescenta.