Os funcionários do Serviço de Urgência do Hospital Padre Américo, em Penafiel, estão, esta terça-feira à tarde, a manifestar-se contra a falta de condições dos utentes que estão internados naquele serviço e contra a exaustão a que estão sujeitos. Hoje estão internadas no serviço de Urgência "mais de 60 pessoas", denunciam.
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O sentimento é de exaustão e de falta de capacidade de resposta aos doentes que entram no Serviço de Urgência do Hospital Padre Américo, em Penafiel, e às dezenas que, recorrentemente, ficam internadas pelos corredores. Esta terça-feira, serão 60 os doentes nessa situação. Um grupo de funcionários, desde assistentes operacionais a médicos e enfermeiros e técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica, manifestou-se à porta do hospital contra a falta de condições para doentes e profissionais.
Descrevem um autêntico "cenário de guerra" e afirmam que não ficam asseguradas a segurança, a higiene, alimentação ou a toma de medicação prescrita aos doentes. Muitos têm elaborado notificações de risco sobre a situação. A equipa fala em "exaustão" dos funcionários e num défice de recursos humanos que leva ao excesso de trabalho.
"Continua a haver doentes internados no serviço de urgência, nos corredores, coisa que não devia existir. Neste momento são 60. Isto compromete o socorro. O cenário infelizmente é de guerra", testemunha a enfermeira Marta Sousa. "Neste momento os profissionais de saúde estão exaustos e não têm tido a capacidade de prestar cuidados adequados. Auxiliares e enfermeiros têm feito notificações de que há doentes em risco. Também temos de nos proteger", explica. Segundo Marta Sousa, há muito mais profissionais indignados com o que se vive dentro da Urgência, mas muitos temem dar a cara "por medo de represálias", sobretudo os que têm contratos precários.
De uma coisa nenhum dos profissionais que se manifestou tem dúvidas: isto é tudo menos "um pico", como muitas vezes argumenta a administração do centro hospitalar. A situação é "crónica".
"Nunca vi uma Urgência conforma vejo esta há meses. Isto não são picos, é todos os dias. Fazemos o nosso melhor, mas tanto tempo não dá para aguentar", lamenta Fernando Silva, assistente operacional neste hospital há 32 anos. Não há auxiliares e enfermeiros suficientes para prestar todos os cuidados necessários, sustenta. "Não conseguimos dar ajuda a todos. Continuamos a fazer notas de risco e estamos exaustos. Alimentação vamos dando, higiene nem sempre", confessa. Falta privacidade para tratar dos doentes. A proporção chega a ser de um auxiliar para 30 doentes e de um enfermeiro para 40, dão como exemplo. "Há doentes com demências que por vezes se despem no corredor e muito ficam em risco de queda", afirma uma enfermeira. "Não temos como ajudar mais", desabafa outra das profissionais.
"O ambiente que se vive é de cansaço extremo. Há muito que vivemos com esta sobrelotação e é quase um desespero por vermos que nada se está a resolver", afirma a médica Ana Reis. "Falar em picos quase que nos ofende. Há de facto situações de maior afluência, mas esta situação é diferente. O hospital está subdimensionado para a população. Há sempre muitos doentes internados na urgência", o que não permite cuidados dignos, adverte.
"Neste momento estamos a enganar as pessoas. Não temos condições para fazer o nosso trabalho da melhor forma e é o que nos preocupa", acrescenta a profissional, dizendo que falta tempo para questões básicas como tratar de pensos, fazer análises ou verificar sinais vitais e para se poder "olhar para o doente" como é preciso.
À administração pede ideias estruturadas. "Temos de deixar de meter a cabeça na areia. Isto não é um pico. As soluções que temos são tampão e pensos rápidos", garante a médica.
Ao JN, o conselho de administração do Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa "confirma a existência de um número elevado de doentes internados na Urgência" e reconhece uma "sobrecarga de trabalho" para os profissionais. Mas "um hospital não pode fechar a porta aos doentes, por muitos que sejam", defende.
A mesma fonte justifica a situação com um somatório de situações, desde uma maior afluência ao serviço devido às altas temperaturas, até à falta de vagas para transferir doentes para os privados, além de faltarem transportes, já que muitas corporações estão dedicadas ao combate aos incêndios. A par disso, uma avaria no equipamento de ressonância magnética de um prestador privado "impediu que vários doentes pudessem ter alta após avaliação".
"Foram tomadas diversas medidas extraordinárias e temporárias, não ideais, para mitigar este efeito, como a alocação de camas suplementares nas alas dos diferentes serviços de internamento e o reativar do serviço de transportes com empresa particular de transportes de doentes", pelo que se espera que amanhã haja "um número bem menor de doentes a aguardar vaga de internamento no Serviço de Urgência".