Turistas semidespidos e embriagados circulam noite e dia pela Rua da Oura, no Algarve, e deixam rasto de destruição. Há relatos de agressões e de manequim "violado".
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Turistas completamente embriagados, sobretudo britânicos, circulam todos os dias, a partir do final da tarde e até madrugada alta pela Avenida Sá Carneiro (popularmente conhecida por Rua da Oura), no centro de Albufeira, vestidos de forma imprópria, por vezes nus, importunando transeuntes e lojistas.
É assim há alguns anos, mas, ao invés de melhorar, a situação tem-se agravado e está a mudar o panorama daquela que já foi uma das artérias nobres da cidade, por muitos considerada a "capital turística" do Algarve. São cada vez menos as famílias a procurar este destino e o comércio tradicional está a desaparecer.
"Durante anos, tive um manequim à porta da loja, mas era constantemente "violado". Primeiro escondi-o mais para dentro, mas tive de o retirar", descreve Ana (nome fictício, como todos os outros que aqui são referidos, uma vez que toda a gente diz ter medo de represálias). A comerciante conta que "ingleses perdidos de bêbados, muitas vezes vestidos apenas com um fio dental, insistiam em simular práticas sexuais com o boneco", causando "uma impressão muito desagradável".
Urinam à vista de idosa
Paula, empresária ligada a atividades turísticas, diz que a principal recomendação que deixa aos seus clientes é para "nem passarem" pela zona. "Há famílias que têm de tapar os olhos a crianças para não verem os ingleses completamente nus", descreve.
Maria tem um café naquela rua e não esconde a indignação. "É uma vergonha e ninguém faz nada. Os donos dos bares, desde que eles estejam a consumir, deixam-nos entrar despidos e fazerem o que querem", acusa, relembrando que ela mesmo fechou uma loja de vestuário, por não aguentar o mau ambiente. "Um destes dias, de manhã cedo, trouxe a minha mãe, que tem 84 anos, e deixei-a sentada na esplanada. Estava um grupo de ingleses a acabar a noite e a urinar contra a parede em frente. Quando a viram, começaram a fazê-lo em repuxo, sem qualquer pudor", revela.
Paula acrescenta uma "situação surreal" numa recente ida ao cabeleireiro: "Estava com uma amiga que trabalha lá, passa um grupo de cinco ingleses praticamente nus e apalpam essa minha amiga. Disse-lhe para chamar a Polícia e mandar identificar os indivíduos, mas ela respondeu-me que não podia, porque o patrão não a autorizava".
Albufeira? Esqueça!
Era o último dia de férias quando Sérgio e a namorada, depois de jantarem, decidiram beber o "último copo" na Rua da Oura. "Vem um britânico e apalpa a minha companheira. Dei-lhe um empurrão e afastei-o. Quando me ia embora, levei um murro nas costas e fiquei inconsciente. Toda a gente viu, mas ninguém fez nada", conta ao JN.
Residente na zona da Grande Lisboa, não hesita quando questionado sobre um eventual regresso a Albufeira: "Esqueça". "De manhã, quando chegamos à loja, é uma porcaria à nossa porta. Os passeios cheios de vómito, garrafas partidas e lixo por todo o lado", descreve por sua vez Marina, mostrando algumas fotos que ela própria fez com o telemóvel, que confirmam este cenário. E explica que o estado de embriaguez destes turistas é tal que alguns ficam a dormir pela rua, porque "já nem se recordam do nome do hotel onde ficam hospedados".
Fotos e vídeos nas redes
Todos estes testemunhos são confirmados pelas centenas de fotos e vídeos que circulam nas redes sociais, em grupos onde cidadãos locais dão largas à sua indignação pela "morte do turismo de famílias" e apelam à intervenção urgente das autoridades para travar esta espiral de degradação.
A par dos excessos dos grupos de desordeiros, também o tráfico de droga é feito "à descarada". "Mal chego à Rua da Oura sou abordado por vendedores ou consumidores. Perguntam-me se quero ou se tenho alguma coisa. É um escândalo o à-vontade com que os traficantes se movimentam às claras pela rua. Em alguns casos, andam pelo meio das pessoas, disfarçados de famílias, com carrinhos de bebé e tudo, como eu já vi", relata Roberto.
Cansada de ver os suspeitos a esconderem a droga nas fendas de uma árvore à sua porta, Ana decidiu tapar o buraco com cimento. "Agora, tenho gente a vir ter comigo a reclamar, dizendo que tenho de ser multada, porque a árvore pode morrer", conclui.
Fiscalização
Câmara em silêncio
O JN tentou ouvir a Câmara Municipal de Albufeira sobre as queixas dos munícipes, mas, apesar dos vários contactos, não recebeu resposta em tempo útil.
Em crescimento
A um jornal local, o presidente da autarquia, José Carlos Rolo, reconheceu há dias o "crescimento de condutas inadequadas".
Números
18 detenções
Já foram detidas 18 pessoas identificadas outras 210 entre 2018 e junho de 2019 devido a ilícitos relacionados com drogas.
6100 doses
Desde 2018, foram apreendidos pela GNR 6100 doses de produtos estupefacientes, entre heroína, cocaína e canábis.