À conta do estigma, as vítimas LGBTI+ são ainda mais vulneráveis. Visibilidade precisa-se.
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Moisés tem 21 anos, o namorado não o deixava tirar a t-shirt na praia, forçava-o a ter relações, batia-lhe a toda a hora. Leonor tem 59, a parceira agrediu-a com um tronco, acordou-a à bofetada, apontou-lhe um punhal à barriga. Dinis, 53 anos, foi de mal a pior. Denunciou o ex-marido e acabou como sem-abrigo ao lado de um homem ainda mais violento. Patrícia, 25 anos, mulher trans, tem passado a vida assim. Primeiro foi o pai, depois um companheiro, a seguir outro. Todos a violentaram.
Houve um momento, não foi há tanto tempo assim e no entanto parece uma eternidade, em que Moisés, chamemos-lhe assim, acrescentemos que tem 21 anos, quase mudou o curso desta história, quase se livrou do homem que o levou ao inferno e por lá o deixou, a agoniar em lume brando, quase teve paz. Passavam poucos meses desde que tinham começado a namorar e ido viver juntos (a partilha de casa foi quase imediata), quando o companheiro o deixou feito num oito. “Deu-me socos, puxou-me o cabelo, mandou-me a cabeça contra a parede, deu-me pontapés nas costas”, vai enumerando, como quem volta a sentir tudo outra vez. No meio daquele drama de violência extrema, soube exatamente o que tinha de fazer. “Disse-lhe para arrumar as coisas dele e sair.” Só que já o namorado estava a abalar, saiu porta fora e seguiu mais as malas, os dois num pranto, quando, do nada, volta para trás a correr, lavado em lágrimas e pedidos de desculpas, sedento por uma segunda oportunidade. Moisés fraquejou, “adorava aquele rapaz”, abriu-lhe a porta e deixou-o ficar, sabe hoje que foi “a pior coisa” que poderia ter feito. Uma semana depois, já o cenário se repetia, as agressões de todas as formas e feitios, ele noites inteiras em claro, a chorar copiosamente, incapaz de desfazer aquele nó que lhe molestava os dias e o corpo. “Às vezes, antes de me deitar, dizia-lhe ‘amanhã quero falar contigo’. Queria acabar tudo. Mas depois de manhã ele perguntava-me e eu dizia que não era nada.”