O presidente da República considerou esta quarta-feira "essencial" assegurar a coesão nacional, que exige um esforço permanente de diálogo e concertação entre o Governo, oposição e parceiros sociais, agora que "a verdade dos tempos difíceis é reconhecida por todos".
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"Em momentos como este, é essencial assegurar a coesão do país. É nestas alturas que temos de nos manter unidos. Exige-se, por isso, um esforço permanente de diálogo e concertação entre o Governo, os partidos da oposição e os parceiros sociais. Este tem sido, aliás, um dos nossos principais ativos", afirmou o chefe de Estado, Aníbal Cavaco Silva, numa intervenção na sessão solene do 25 de Abril, na Assembleia da República.
Sublinhando que numa democracia como a portuguesa "há sempre espaço para o pluralismo e para a diversidade de opinião, Cavaco Silva deixou um alerta: "Não é combatendo-nos uns aos outros que iremos combater a crise".
"O 'Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego', firmado em janeiro deste ano, entre o Governo e os parceiros sociais, é o sinal mais claro de um sentido de responsabilidade partilhada e de uma vontade genuína de que a execução do programa de assistência financeira se processe num contexto de paz e coesão social", acrescentou, referindo-se ao acordo de concertação social que a UGT chegou a ameaçar denunciar na semana passada.
Depois de na primeira parte do seu discurso ter apelado ao contributo de todos os portugueses para projetar uma imagem positiva de Portugal no estrangeiro, Cavaco Silva ressalvou nos parágrafos finais que tal não significa que queira fazer esquecer os "graves problemas da sociedade" portuguesa.
"Por mais de uma vez, sublinhei a importância de falar verdade aos portugueses. Agora, a verdade dos tempos difíceis é reconhecida por todos", sublinhou, assinalando estar "plenamente consciente da situação do país, dos problemas concretos dos portugueses", como o desemprego, a precariedade do emprego jovem, os novos pobres, o encerramento de empresas, "os dramas que atingem famílias inteiras, as condições de solidão e de carência que afetam milhares de idosos".
Por outro lado, continuou Cavaco Silva, existem também problemas estruturais na sociedade e na economia que têm de ser encarados com "sentido de futuro", lembrando que sempre falou sobre a importância do crescimento económico apoiado nas pequenas e médias empresas e recentemente promoveu um debate sobre os efeitos da quebra de natalidade.
Assim, preconizou, é necessário um esforço coletivo para enfrentar problemas e descobrir potencialidades.
"São inquestionáveis as potencialidades da economia do mar", referiu, destacando ainda o facto de Portugal ser o terceiro país da União com maior participação das energias renováveis no consumo de eletricidade, nota que teve como resposta algum 'burburinho' na bancada do PS, partido que tinha as energias renováveis como uma das 'bandeiras' do Governo de José Sócrates.
Mas, acrescentou, é importante que os estrangeiros saibam que o melhor ativo de Portugal são as pessoas. "Os portugueses têm mostrado uma capacidade notável de adaptação às dificuldades do presente", destacou o presidente da República, que desde há um ano tem alertado para a existência de limites para os sacrifícios que são impostos, chegando mesmo a considerar que em alguns casos, como dos pensionistas, esses limites possam já ter sido ultrapassados.
Considerando que é em alturas como esta que o espirito solidário dos portugueses adquire uma "dimensão que orgulha e comove", o chefe de Estado voltou a referir as redes de solidariedade e o crescimento do voluntariado, sublinhando que "o apoio aos mais atingidos pela crise é uma realidade".
Numa intervenção que encerrou a sessão solene do 25 de Abril na Assembleia da República, este ano marcada pela ausência dos chamados "capitães de Abril", do antigo Presidente da Assembleia da República Mário Soares e do histórico socialista Manuel Alegre, o chefe de Estado voltou ainda a destacar a "forma rigorosa e determinada" como tem sido cumprido o programa de ajuda financeira.
"As avaliações da missão tripartida reconhecem inequivocamente como positivo o trabalho em curso no plano da consolidação orçamental, da estabilidade do sistema financeiro e das reformas necessárias ao reforço do crescimento potencial e da competitividade", reiterou.
Corrigir desinformação no estrangeiro
Antes, o presidente da República tinha exortado "todos os portugueses" a corrigir a falta de informação e a desinformação que diz existir no estrangeiro sobre Portugal, sublinhando que isso contribuirá para o crescimento da economia e a criação de emprego.
"Todos os portugueses e não apenas os agentes políticos têm o dever de mostrar ao mundo o valor do seu país. Neste 25 de Abril, a minha intervenção tem um objetivo preciso e uma razão prática: exortar os nossos concidadãos a corrigir a falta de informação ou até a desinformação que subsiste no estrangeiro sobre o país que somos", apelou o chefe de Estado.
Se essa tarefa for feita com sucesso, sublinhou, estar-se-á a contribuir para melhorar as condições da economia e da criação de emprego.
Num discurso em que começou por lembrar a revolução feita há 38 anos para construir um regime democrático e saudou aqueles que tiveram "a coragem" para operar essa mudança e "os artesãos da nossa democracia", Cavaco Silva recordou ainda o caminho difícil e o "trabalho árduo" desenvolvido nos anos seguintes para demonstrar internacionalmente a credibilidade de Portugal como Estado soberano.
"O regime democrático encontra-se atualmente consolidado porque o bom senso prevaleceu sobre o aventureirismo, porque o sentido de responsabilidade foi mais forte que as tentações extremistas", notou Cavaco Silva.
Agora, continuou, passadas mais de três décadas do 25 de Abril, os portugueses são de novo chamados "a explicar Portugal ao mundo" e a valorizar o que existe de bom, com as exportações, o turismo e o investimento privado produtivo a constituírem os elementos capazes para contribuir positivamente para a recuperação da economia e para a criação de emprego.
Contudo, embora o nível das exportações e do investimento privado estejam dependentes de múltiplos fatores, a imagem e a credibilidade de Portugal são dois desses elementos, assinalou o presidente da República, sublinhando que através de "uma perceção externa fidedigna e positiva de Portugal" se conseguirá vender mais bens e serviços ao estrangeiro e a melhores preços e atrair investimento externo e obter financiamento a taxas mais favoráveis.
"Muito se tem dito e escrito no estrangeiro sobre o nosso país que não tem a mínima correspondência com a realidade", salientou o chefe de Estado, considerando que algumas vezes existe "a intenção deliberada" de dar um retrato negativo de Portugal ou de evidenciar apenas uma parte da realidade.
Mas, pior do que isso, frisou Cavaco Silva, "essa perceção negativa é veiculada internamente" e constitui um fator de desmobilização dos cidadãos, ao mesmo tempo que prejudica a expetativa dos agentes económicos.
"O 25 de Abril dos nossos dias está também em mostrar ao mundo o muito de positivo que o país tem e o respeito que merecemos das outras nações. Esta é, repito, uma tarefa para a qual são convocados todos os cidadãos", disse, considerando que para além da ação dos políticos, importa consolidar a projeção externa de Portugal, vencer preconceitos, ideias feitas e a falta de informação isenta que existe sobre Portugal.
Lembrando que enquanto presidente da República tem procurado contribuir para a imagem de um Portugal credível, Cavaco Silva desafiou, assim, todos os portugueses a juntarem a sua voz à do chefe de Estado, à dos agentes políticos e dos diplomatas.
Contudo, ressalvou, isto não significa que se alimente "um nacionalismo passadista, construído a partir do mito e da imaginação, nem de regressar a um discurso típico do regime deposto a 25 de Abril".
"Não temos de recorrer à ficção, nem temos de criar uma imagem ilusória da realidade portuguesa", notou Cavaco Silva, que no passado já criticou a tendência de alguns políticos de recorrer à ilusão e ocultar a realidade.
A ciência, a cultura, a "relação exemplar" com os países de língua portuguesa, o profissionalismo demonstrado pelas Forças Armadas nas missões de paz e humanitárias e as funções internacionais de grande relevo ocupadas por portugueses, foram bons exemplos citados por Cavaco Silva.