Uma providência cautelar para impedir que o Governo venda em leilão a coleção de 85 obras de Joan Miró foi, esta quinta-feira, entregue no Tribunal Administrativo de Lisboa.
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Em declarações à agência Lusa, a deputada Gabriela Canavilhas confirmou o envio da providência cautelar, anunciado na quarta-feira, no parlamento, para o Tribunal, para "evitar a venda lesiva para o Estado" da coleção proveniente da nacionalização do Banco Português de Negócios (BPN).
"Esgotámos toda a nossa capacidade de alertar para o cumprimento da lei. Restou-nos recorrer ao tribunal", apontou Gabriela Canavilhas sobre esta nova iniciativa para tentar suspender o processo, depois de o PS ter apresentado no parlamento um projeto de resolução contra a venda, chumbado pela maioria, tal como outro, no mesmo sentido, apresentado pelo PCP.
"Estamos certos de que há irregularidades no processo", disse, convicta, a deputada socialista e ex-ministra da Cultura, sobre as expectativas do resultado da providência cautelar.
O PS alerta para o facto de a coleção de 85 quadros de Miró, provenientes do ex-BPN, ter passado a "constituir propriedade definitiva do Estado a partir de 2012", tendo o pintor uma importância "absolutamente inquestionável, não havendo em Portugal nenhum acervo deste pintor - ou de qualquer outro deste período com esta magnitude e grandeza -- que se lhe compare em valor".
Lembra ainda que a Lei de Bases do Património Cultural estabelece "responsabilidades inequívocas" ao Estado, como "a inventariação, classificação e ainda normas específicas quanto à exportação, expedição, importação, admissão e comércio de obras de arte", "requisitos legais" que entende não terem sido salvaguardados.
Na sexta-feira, deverá ser votado em plenário, na Assembleia da República, um projeto de resolução também contra a venda dos quadros, apresentado pelo Grupo Parlamentar "Os Verdes".
Na quinta-feira, foi aprovado, por unanimidade, na Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura, um parecer e relatório sobre a petição em defesa da "Manutenção em Portugal das obras de Miró", que já recolheu mais de 8.800 assinaturas desde o início de janeiro.
Os peticionários também enviaram o documento para o Parlamento Europeu, esperando que aquela instância possa inviabilizar o processo.
Em causa está o conjunto de obras do pintor catalão que ficou nas mãos do Estado após a nacionalização do BPN, e que o Governo pretende vender num leilão organizado pela Christie"s, em Londres, a 04 e 05 de fevereiro.
A deputada Gabriela Canavilhas entregou a 15 de janeiro um requerimento à Direção-Geral do Património solicitando a inventariação e classificação das obras de Miró, mas diz que, "até agora, infelizmente, não houve nenhuma resposta".
Quando a petição foi lançada, o secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, disse que "a aquisição da coleção de Joan Miró não é considerada uma prioridade no atual contexto de organização das coleções do Estado" português.
Contactado pela agência Lusa sobre a providência cautelar, o galerista Carlos Cabral Nunes, responsável pela petição, congratulou-se pela iniciativa do PS e disse que, desde que o caso foi conhecido internacionalmente, tem recebido "inúmeras mensagens de solidariedade e apoio".
"Recebi de Espanha muitas mensagens de apoio e uma, muito interessante, dando conta da disponibilidade de um grupo internacional de mecenas em patrocinar um futuro museu que o Estado venha a criar com a coleção das 85 obras de Joan Miró", revelou à Lusa.
Sobre o projeto de resolução da iniciativa de "Os Verdes", que será votado na sexta-feira, o galerista e curador Carlos Cabral Nunes fez um apelo aos deputados do parlamento para que "o resultado seja diferente de quando foram rejeitados os do PS e do PCP".
"Esta será a derradeira possibilidade de os deputados darem um sinal extraordinário da nossa democracia aos cidadãos. Por isso continuo a apelar a que votem positivamente esse projeto que pretende a suspensão da venda das obras, não nos submetendo a mais esta vergonha de ter de ser uma providência cautelar a cancelar esta venda altamente lesiva para o nosso Estado", sustentou.