<p>Em pleno clima de uma guerra, com contornos mais partidários que institucionais, o chefe de Estado e o do Governo encontram-se no Palácio de Belém para inciarem o processo de indigitação do próximo primeiro-ministro. </p>
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Hoje é quinta-feira, dia de Conselho de Ministros e José Sócrates vai lá estar, embora não tenha deliberações na agenda. Hoje é também dia da reunião semanal entre o primeiro-ministro e o presidente da República. Sócrates vai estar em Belém, às 15h15, mas na qualidade de secretário-geral do PS, "o partido do Governo", como disse e repetiu Cavaco, na comunicação de anteontem, na qual acusou os socialistas de manipulação no caso das escutas. Não há audiência formal do chefe do executivo. Sem explicações, de Belém ou de S.Bento. Apenas um sublinhado: "O Governo já está só em gestão".
A audiência foi marcada antes da declaração de anteontem. Seguir-se-ão audições aos outros partidos, com vista à indigitação do primeiro-ministro.
A reunião de hoje será difícil. Em particular para o líder socialista, que tentará manter, segundo fontes próximas, uma atitude de Estado para contrastar com o que consideram ter sido a "pouco elevada" comunicação do chefe de Estado. Por outras palavras, foi esta a mensagem que Sócrates e o seu núcleo duro repetiram ao longo do dia de ontem, ao dizer não querer "de nenhuma forma contribuir para uma polémica que desgasta e desprestigia as instituições". "O meu dever é concentrar-me naquilo que é importante para o país, responder aos problemas, aos desafios e assegurar uma governação que esteja à altura dos tempos em que vivemos". A seguir, citado pela Lusa, ainda reforçou que não alimenta tabus. E ainda avisou que espera "que não seja preciso voltar ao assunto".
A estratégia de insistir num tom de "responsabilidade" foi reforçada pelo ministro e dirigente socialista, Augusto Santos Silva, ao insistir que "é cada vez mais claro que o PS é o referencial de estabilidade do país"
A insistência na tónica da "estabilidade" é uma resposta indirecta a uma hipotética intenção do presidente da República de não indigitar Sócrates como primeiro-ministro, com o argumento de não haver solidez na maioria de Esquerda, encabeçada pelo PS. Ou, outra hipótese,de estar em preparação a rejeição, no Parlamento, do programa do Governo.
De acordo com a Constituição, o presidente da República nomeia o primeiro-ministro, tendo em conta os resultados eleitorais. Ou seja o líder do partido mais votado. A seguir à posse do Governo, terá de ser apresentado o programa, que só será votado se algum grupo parlamentar propuser a sua rejeição. Se não houver uma maioria, o programa não passará e Cavaco Silva poderá optar por outra solução de Governo.
É neste contexto que é relevante que Pacheco Pereira tenha escrito, ontem no seu blog, que "não é líquido que o presidente da República aceite todas as combinações aritméticas que o número de deputados e partidos possa permitir para fazer uma maioria". E lembra: "Tem nisso um precedente em Mário Soares, que, após a moção de censura que derrubou o governo minoritário de Cavaco Silva, não aceitou a solução maioritária do PS+PRD que Constâncio lhe propôs". Foi em 1987, Soares optou por eleições e Cavaco ganhou maioria absoluta.