O Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra apresenta hoje, quinta-feira, um estudo que estima existirem em Portugal 1,2 milhões de armas de fogo ilegais e 1,4 milhões legais, sem contar com aquelas que pertencem a forças de segurança e militares.
Corpo do artigo
"É grave", comenta José Manuel Pureza, dirigente do Núcleo de Estudos para a Paz, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (CES/UC), que realizou aquela investigação, ao longo dos últimos dois anos, com financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia.
José Manuel Pureza faz aquela apreciação negativa, tendo em conta que a Amnistia Internacional estabelece como padrão, em termos internacionais, a existência de uma arma de fogo por dez habitantes.
O CES, somando legais e ilegais, aponta para a existência de 2,6 milhões de armas de fogo em posse de civis, o que significa que haverá cerca de 2,5 armas por dez habitantes.
De outro modo ainda, dir-se-á que existem, em Portugal, armas de fogo para um quarto da população portuguesa, que ultrapassou, já há vários anos, a barreira dos 10 milhões.
A maior preocupação reside no número de armas ilegais estimado pelo estudo do CES, que foi realizado pelas investigadoras Tatiana Moura e Rita Santos, com a colaboração da associação brasileira Viva Rio. Uma entidade que tem feito trabalhos do mesmo género no Brasil e, em particular, no Rio de Janeiro, recorrendo a uma metodologia relativamente complexa, a explicar, hoje, na apresentação do estudo sobre "Violência e Armas Ligeiras: Um Retrato Português".
Outra das conclusões do estudo a que o JN teve acesso indica que a maioria das armas ilegais é espingardas de caça. As pistolas e os revólveres ilegais andarão na ordem dos 300 mil: 25% de 1,2 milhões.
O trabalho do Núcleo de Estudos para a Paz do CES conclui também que muitas das armas ilegais já foram legais. A mudança é explicada, em boa medida, pelo furto e extravio dessas armas. Entre 2004 e 2007, contabilizam as investigadoras, foram furtadas ou extraviadas 5913 armas de fogo, o que deu uma média de quatro por dia (70% de caçadeiras, 17% de pistolas e 9% de revólveres).
O estudo do CES é tido como o primeiro trabalho de base científica realizado, em Portugal, sobre a realidade das armas. Mas, já no Verão de 2008, foi noticiada outra estimativa, que apontava para a existência de 1,4 milhões de armas ilegais. Um número que o ministro da Administração Interna, Rui Pereira, classificou, então, como "especulativo e fantasioso". Para o ministro, a dimensão do problema situava-se, apenas, na ordem das "dezenas de milhar" de armas ilegais.
Ontem, em declarações ao JN, sob anonimato, duas fontes conhecedoras do mercado das armas "pintaram" um quadro mais negro, considerando que a estimativa do CES peca por defeito.
Esse pessimismo foi justificado, sobretudo, pela alteração à lei das armas produzida em 2009, sob proposta do próprio Rui Pereira.
Por um lado, essa alteração legislativa veio dificultar a obtenção de licenças de uso e porte de arma, empurrando muitos interessados para o mercado negro; por outro, as "armas longas semi-automáticas com aspecto militar" mudaram de classe (de C para A) e a posse das mesmas passou a ser proibida para a generalidade dos civis que já as possuíam, de forma legal… "Apertou-se a torneira e o mercado negro aumentou", resumiu uma fonte.