Laborinho Lúcio: "A cultura mede-se por aquilo que cada um tem vontade de adquirir"
Laborinho Lúcio foi convidado numa das sessões do Correntes Itinerantes. Aos 78 anos, o ex-ministro pensa, agora, no quarto romance: uma história sobre o regime atual
Corpo do artigo
"Sou um jovem escritor com um grande futuro atrás de mim", brincou Álvaro Laborinho Lúcio, em resposta à pergunta do jornalista e escritor, José Mário Silva, sobre o seu "despertar tardio" para a escrita de romances.
Foi um juiz "fora da caixa", "eterno contador de histórias", numa conversa animada, que ora arrancou gargalhadas, ora, mais a sério, levou a plateia à reflexão, aquele que esteve em Navais.
Foi uma das duas sessões do Correntes Itinerantes, o mais recente braço do Correntes d'Escritas - Encontro de Escritores de Expressão Ibérica. A ideia é "descentralizar" e, durante o encontro, levar a cultura a todo o concelho.
"Estou convencido que em nenhum local a proporção entre o número de habitantes e o número de pessoas presentes é tão grande! A cultura não se mede por aquilo que sabemos, mede-se por aquilo que cada um tem vontade de adquirir", começou por dizer Laborinho Lúcio, perante a plateia de cerca de uma centena de pessoas que, na biblioteca da pequena freguesia de Navais, ouvia o ex-ministro da Justiça.
Falou dos primeiros escritos, do "professor Anselmo de Castro" - que dá nome à biblioteca e lhe deu Direito Processual Civil e Direito Executivo -, da loja de fazendas do avô, do teatro, do polícia com quem discutiu Jorge de Sena e Fernando Namora - e dos preconceitos que temos quanto à "cultura" de alguns - e de como, com 72 anos, descobriu na escrita de romances um novo prazer.
"Há imensas pessoas que nascem, vivem e morrem e ninguém dá por ela. Isso magoa-me", diz, para explicar porque decidiu escrever.
"O Beco da Liberdade", o seu último trabalho, é "a história de um caso mal resolvido" e, ao mesmo tempo, "uma reflexão sobre o ato de julgar", contou José Mário Silva, dando o mote para mais uma história em torno do último livro do ex-ministro.
Sobre o futuro, um quarto romance na forja. "Tenho muita vontade de escrever um romance sobre o regime atual. Andando 40 anos para a frente e 40 anos para trás. Abordando África, a descolonização, os grandes conflitos políticos... Tudo em ficção", rematou.
Este sábado, o encontro poveiro chega ao fim com dois momentos altos: às 17 horas passa o documentário Correntes d'Escritas, de João Cayatte; às 18 horas, o festival fecha com a entrega dos prémios literários. Tudo no Cine-Teatro Garrett.