Thee Oh Sees viram o festival ao contrário e varrem finalmente os corações dos duros. Bem-vindo quem acabou de chegar, o festival finalmente está ótimo.
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Se contarmos as 25 horas que correram desde que os We Trust abriram o festival (a dizer que iam acabar, o que foi curioso), até à hora do jantar do 2.º dia (jantou-se cedo, a modorra musical deixara demasiada gente no rio e na preguiça do campismo, a fazer gazeta aos concertos), ficamos com oito banda e nenhuma de rock que nos arrebatasse - ainda que haja, claro, fãs e até férreos, eram os da frente, dos Minor Victories, da Orelha Negra, da Joana Serrat (parece espanhola, é americana, é uma folker de temas fraquinhos, desbotados, zero nervo) e até fãs convictos da espalmada tepidez dos We Trust e dos Best Youth, e todos eles merecem respeito.
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Mas, 25 horas e oito bandas depois e nada que, para lá de Whitney (e nem para todos) e de UMO se parecesse com uma emoção, com a coragem, risco, virtude, valor, medo?
25 horas depois tudo mudou. Apareceu um crustáceo rock metálico montado em duas baterias siamesas, levado à frente por John Dwyer e a sua guitarra puxada para cima do peito, seguido atrás por um baixo que rabeava como a ponta de setas do escorpião.
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Deram-nos tudo de uma vez, de repente: garage, psicadélico, alternativo, cuspido, rock, punk, noise, e pós-punk. Para os da frente - casa de encosta quase cheia, excelente circulação - foi como darem-lhes fósforos para brincar: mosh imediato, roda-punk, pó (sim, é sempre dourado, é só cénico, não aflige ninguém) e surf nas mãos e braços uns dos outros, finalmente entregues ao rock de olhos fechados, finalmente a poder confiar outra vez no seu poder.
A metronómica peça - sim, o rock é muitas vezes o melhor teatro -, alavancada em composições ou muito curtas ou muito compridas e cósmicas e com choques eventuais de cometas entre si, foi como uma tempestade emocional para os mais duros, os que vão sempre à frente e que continuam a gostam de sentir um bocadinho de medo num espectáculo ao vivo.
No meio, inesperadamente, como em sketches de slapstick muito curtos e muito rápidos, que passavam se deixássemos um segundo de olhar, Dwyer falou. É muito cómico, o australiano, fala muito extremamente rápido e era capaz seguramente de bater Kendrick Lamar no duplo tempo e no triplo tempo, bastava que quisesse. "Raios, vocês são bonitos. Raios!". E: "Ninguém segura Portugal. Vocês são uns animais. Yeah!" E: "O que é isso, esse cartaz, LSD Soundsystem? Yeah! Quero muito ver LCD Soundsystem. E vocês?". E a peça terminou com um grande e estendido bruá. Obrigado Thee Oh Sees, já temos outra vez fé.