O jovem Tian é enviado com a irmã para casa da avó, nas montanhas de Sichuan, na China, para se dedicar mais aos estudos. Mas Tian prefere explorar a floresta em redor e tem um encontro inesperado com Moon, um pequeno panda. É esta a história de "Moon, o Panda", que Gilles de Maistre realizou com Pandas a sério, numa rara ocasião em que as autoridades chinesas o autorizaram. O realizador explicou tudo ao JN.
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Já não é o primeiro filme que faz com animais.
É verdade que já fiz vários filmes com animais como personagens centrais. Gosto de contar histórias que possam agradar a um público familiar. E ao longo de todos estes filmes fiquei com a impressão que podíamos falar de muitas coisas, graças aos animais. É sempre isso que me guia, que pais e filhos possam estar juntos, hoje não há muita coisa que se possa partilhar em família.
O que o levou a escolher agora os Panda?
Os Panda são um símbolo universal de paz, de felicidade. Representam muito a natureza. Utilizamo-los muito nesse sentido, na nossa cultura universal, na publicidade, em logotipos. Os Panda estão em todo o lado, tocam muito os humanos, mais do que qualquer outro animal. Serviram-me para contar uma história que é sobre uma libertação.
Que temas quis sublinhar com esta história?
A maneira como hoje os jovens olham para a vida, a sua relação com a escola, temas que tocam todas as famílias. É a história de uma família que tenta escapar aos seus problemas quotidianos, como todos temos, com os nossos pais ou com os nossos filhos, para encontrar um pouco de felicidade, para se ligar ao mundo exterior, algo que temos tendência a esquecer. No fundo, tentam escapar da sua prisão quotidiana.
O filme mostra que os adultos poderiam ter feito as coisas de outra maneira. E há uma mensagem para os jovens que ainda têm tempo para se comportar de forma diferente.
No nosso filme temos crianças muito jovens, face aos animais, mesmo quando há cenas mais complicadas. São os jovens que vão hoje ao cinema, temos uma grande responsabilidade de colocar um filme face a uma criança de 4 ou 5 anos.
Em que termos é que sentiu essa responsabilidade?
Temos de saber bem como falar das coisas. Também é pela beleza que temos vontade de salvar o mundo. Não necessariamente dizendo que tudo é feio e que vai mal. Sofre-se no mundo, é certo, mas esse é apenas meio copo, há a outra metade, podemos passear, assistir a um belo pôr-do-sol, observar um pássaro que voa.
Filmaram com Pandas a sério ou há muitos efeitos digitais?
Tivemos a felicidade de filmar com verdadeiros Panda. A este ponto, nunca nenhum filme tinha sido feito. Há uns vinte anos que não se faziam cenas entre Pandas e humanos. É muito difícil de acontecer. Os chineses aceitaram excecionalmente que o fizéssemos e dificilmente haverá outro filme assim. O nosso filme é um objeto único. Demorámos cinco anos a convencê-los.
Nunca pensou filmar com Pandas digitais?
É uma coisa que nunca fiz, filmei sempre com animais verdadeiros. Há um suplemento de alma., que não temos com os efeitos especiais. Os efeitos especiais de animais são extremamente complicados e vemos sempre que não é de verdade. Fazer um filme inteiro com um Panda de efeitos especiais não é ainda possível hoje.
Como é que se sobrevive cinco anos sem saber se ia poder filmar com Pandas verdadeiros?
Mesmo na véspera das filmagens não tínhamos a certeza. Mas tivemos sempre confiança. Nunca duvidei que o filme fosse feito. É preciso sonhar. Penso que eles compreenderam o que eu sentia pelo filme, que a mensagem era boa. Toda a gente com quem falámos também eram pais. Houve algo para lá do negócio, do dinheiro. Também houve essa conexão que nós seres humanos temos. O humano acaba sempre por triunfar.
Quais eram as principais reservas das autoridades chinesas?
Para os chineses, os Pandas não são apenas um animal, são um mito. Não nos aproximamos deles, não interagimos com eles, muito simplesmente porque não se faz. Há muito pouca gente, além dos tratadores, que se aproximam deles. E esses são os Panda em cativeiro. Há muito poucos na natureza, e estão muito protegidos. E a história do filme passava essa barreira, que é um tabu para eles.
Finalmente como os conseguiram convencer?
Foi um verdadeiro milagre. Já fiz muitos filmes deste género, isso sossegou-os, saber que respeitamos sempre os animais, adaptamo-nos bem, não impomos nada. Perceberam que os animais iam estar sempre em liberdade. E que quando vissem que eles estavam cansados, parávamos. Isso também era importante para o meu filme, essa ética a respeitar.
Deve ter visto muitos dos Panda que estão em jardins zoológicos por todo o mundo.
Vi muitos. Mas pertencem todos á China. São alugados aos jardins zoológicos. Há vários em França, mas são todos propriedade da China.
Teve oportunidade de tocar num Panda?
Sim, tive essa felicidade. É um animal que chega ao pé de nós com todo esse passado de simpatia. É um pouco como um humano feliz. Come, dorme, brinca, não tem preocupações. Para eles a vida é bela. São muito doces, muito redondos. É um animal Mcom uma forte presença diferente de qualquer outro. E muito raro.
Por comparação com os outros animais com que trabalhou, como o leão ou o jaguar, o Panda deve ser muito menos agressivo.
Mas é um animal forte, e grande. Sobretudo quando estão em liberdade, não podemos chegar muito perto. Projetamos muitas coisas sobre eles, mas são animais selvagens. Não estão domados, quando veem um humano ninguém os consegue parar.
E o jovem Tian, como o escolheu?
Foi a produtora chinesa que me disse que conhecia uma cantora francesa muito conhecida lá, casada com um chinês, uma grande estrela de cinema, e que tinham um filho com a idade da personagem. Mas estavam muito reticentes, porque não queriam o filho já tão mediatizado. Tinha entrado num reality show quando era muito pequeno e que teve muito sucesso e desde então tinham-no um pouco escondido.
Foi difícil convencê-los?
Mandámos-lhe o guião, ficaram todos encantados com a proximidade com os Pandas e a história era mesmo muito próxima da família deles. Era quase um documentário sobre a família deles. Finalmente, o pai fez o papel do pai e a irmã mais nova o da irmã.
Há um mito de que no cinema o mais difícil é trabalhar com crianças e com animais. O Gilles trabalhou aqui com os dois ao mesmo tempo...
Isso é verdade em filmes em que as crianças ou os animais são personagens acessórias, só têm um ou dois dias de rodagem. Os animais vêm com os seus tratadores. No nosso caso, é maravilhoso, são eles os protagonistas, mas tudo está bem preparado com antecedência.
Tem uma explicação para este seu fascínio pelos animais?
É mais uma paixão pela vida. Gosto de partilhar com as pessoas as coisas que me tocam. Gosto de contar este tipo de histórias, que mais ninguém faz. É por isso que continuo a fazer estes filmes. É óbvio que é maravilhoso aproximar-me de um leão ou de um Panda, e de perceber que podemos comunicar com eles, mas o que me apaixona mais é a natureza. Gosto de fazer as pessoas sonhar e fazê-las entender que vale a pena proteger a natureza.