Por que é que o público ignorou tão frontalmente o rocker do Texas? E por que é que os First Breath After Coma não estavam no palco principal?
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Kevin Robert Morby deixou para trás o baixo dos Woods e o seu psicadelismo folk para se fundar a solo no Texas e num novo trilho de "indie rock". Tem 28 anos, três discos, três singles e uma carreira segura ascensível que merece a nossa atenção.
Mas não a teve, há pouco, ao final da tarde, na encosta olimpicamente indiferente de Coura, com dois pares de milhares de pessoas sentadas ao por do sol, o sol a bater e a descer de lado (o esquerdo quando estamos virados para o palco), a refulgir entre as árvores do anfiteatro relvado do 24.º Vodafone Paredes de Coura, e o povo a ignorar o artista que abriu ao 3.º dia o palco principal Vodafone.
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Porquê? Porque o seu rock, eventualmente, não é um rock rascante ou desafiante ou coisa que nos possa fazer sentir medo, com ele a cantar os versos da vida desavinda de "All of my life" ("All of my life spent on you/ Just to be by your side, but you never came / And you'd call my name just to disappear") e da mulher que não volta e da mulher que, diz ele, nunca faz aquilo que diz, mas ele a cantar sem urgência, sem nos fazer sentir a carência, quase sem emoção, num remanso calculado e que se conforma.
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Depois de o festival ter sido, literalmente, virado do avesso pelos "aussies" Thee Oh Sees no início da noite do 2.º dia de Coura, a noite da alucinação LCD Soundsystem - até aí, ou seja, nas primeiras 25 horas do festival, refluímos como quem corre para trás, como não há memória nos tempos recentes de Coura, a ressacar sem rock à altura -, depois disso precisamos de mais, muito mais do que da tepidez de Kevin Robert Morby. Ele tentou - e disse "obrigado, obrigado, obrigado, este é agora o nosso pais favorito no mundo" e ainda "hey, vocês são os maiores" -, mas descontando um parco par de dezenas de pessoas à frente, lá em baixo, ninguém lhe ligou e havia até gente tranquilamente entregue a ler romances vermelhos e "Os transparentes" de Ondjaki na relva.
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Ao mesmo tempo, decorria no palco pequeno Vodafone FM uma pequena deflagração de clarões pós-rock de Leiria: a estreia dos First Breath After Coma, nova banda saída da extinção dos Kafka Dog, agora adeptos convictos e confessos dos torvelinhos instrumentais de Explosions in the Sky, que encherem o pátio pedrado do palco de excitação. Eram eles, sem dúvida, quem deveria estar a tocar no palco central. Aposta-se seguro contra dobrado: para o ano, os de Leiria vão subir ao altar principal.