A vitória de José Neves na 2.ª edição do Grande Prémio Douro Internacional já tem um lugar na história do ciclismo nacional, pelo facto de o corredor da W52/F. C. Porto ter ficado, a meio da prova, sem qualquer companheiro de equipa, devido a uma polémica suspensão.
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O ribatejano, de 26 anos, não se deixou abater e, imbuído da responsabilidade de dignificar a equipa, lutou contra tudo e todos, segurando a camisola amarela que, confessou ao JN, entra na lista dos seus maiores êxitos. Agora o sonho está apontado à Volta a Portugal.
Qual é a sensação de vencer este GP Douro Internacional?
É uma sensação de dever cumprido. Vínhamos para esta prova com muita motivação de vencer, e só tenho de agradecer a toda a equipa por ter estado sempre a apoiar-me, mesmo quando passei a alinhar sozinho. Eles estiveram sempre na minha mente.
E, curiosamente, a corrida nem começou bem para si...
Sim, no primeiro dia estava muito calor. Tínhamos uma tática para eu, na última subida, arrancar, quando faltassem poucos quilómetros, mas não estava com boas sensações. Talvez pela temperatura, as pernas não responderam bem e não consegui cumprir.
Mas logo na segunda etapa passou a ser líder. Mudou alguma coisa?
Não, mantivemos a mesma tática, mas desta vez senti-me muito melhor e tudo saiu na perfeição. Arranquei no sítio certo e consegui fazer a diferença em relação aos adversários.
E como foram os últimos dois dias, já como único corredor da equipa em prova?
No contrarrelógio pensei que ia render mais do que consegui, mas fiquei um pouco aquém das minhas expectativas, embora tenha conseguido segurar a camisola amarela. Para a etapa final, sabia que era o tudo ou nada. A tirada começou muito rápida e não estava a encontrar o melhor ritmo, mas a meio melhorei o rendimento e felizmente consegui vencer.
A equipa já o tinha destinado como o homem para lutar pela vitória nesta prova?
Se estivesse bem seria um dos ciclistas da equipa para lutar pela classificação geral, tal como podiam ser mais dois companheiros com qualidades para fazer a diferença nas subidas e no contrarrelógio. Foi sempre entre nós os três.
Como lida um ciclista com as temperaturas de mais de 35 graus durante toda a prova?
É tentar manter ao máximo a calma, embora nem sempre seja possível. Sabemos que vamos a sofrer, mas os incentivos das pessoas na berma da estrada ajudam sempre. Sobretudo na última etapa houve muita gente a apoiar-nos e isso foi precioso.
Lembra-se na sua carreira de correr com dias tão quentes?
Eu vivo numa parte entre o Ribatejo e o Alentejo e há alguns anos apanhei temperaturas destas quando estava a treinar. Mas, recentemente, não temos dias tão quentes. Na primeira etapa desta prova chegámos a apanhar 51 graus na estrada, mas o pior é que foram todos os dias assim.
Quão importante era para W52/F. C. Porto vencer este GP Douro Internacional?
Muito importante para a equipa e para mim. Já o ano passado gostei muito desta prova, mesmo tendo acabado em segundo lugar. A organização é muito boa e o percurso duro enquadra-se nas nossas características. Desta vez, queríamos estar na frente da corrida desde o início. Este Grande Prémio do Douro, disputado no Norte, tal como os do JN e O Jogo significam muito para nós, para dignificar as cores da W52 e do F. C. Porto.
O que pensou quando todos os seus companheiros de equipa foram obrigados a retirar-se da corrida?
Foi um misto de emoções, com muita tristeza, mas também com a responsabilidade de vencer por eles. No ano passado, nos campeonatos nacionais, eles também trabalharam muito para eu vencer e felizmente consegui. Durante um ano tive a responsabilidade de envergar a camisola de campeão.
No contrarrelógio veio com a camisola assinada por todos os seus companheiros, como surgiu essa ideia?
Fui eu que lhes pedi para assinar, porque queria sentir a força deles no contrarrelógio. Eles estiveram sempre comigo, foi algo muito especial sentir-me acompanhado.
Esta foi uma das vitórias mais saborosas da sua carreira?
É uma vitória histórica porque correr sozinho contra um pelotão inteiro não foi nada fácil. O ciclismo é um desporto coletivo, e não individual, e sem a equipa é difícil conseguir-se alguma coisa.
Após dois anos numa equipa espanhola, decidiu, em 2021, voltar a Portugal e à W52/F. C. Porto. Satisfeito com a decisão?
Sim, sinto-me muito bem nesta equipa. Sou acarinhado. Quando estive no estrangeiro foi complicado por estar sozinho. Aqui em Portugal conheço toda a gente no pelotão, estamos sempre a falar. Há rivalidade mas companheirismo. Lá fora é cada um por si.
Que objetivos tem, a curto prazo, para a sua carreira?
O meu sonho é vencer uma Volta a Portugal, onde nunca participei, e ainda ser campeão nacional de contrarrelógio.