O número é semelhante em todo o Mundo: cerca de 0,7% da população sofre de esquizofrenia. O que, contas feitas, significa que a doença afeta cerca de 70 mil pessoas em Portugal. Destas, apenas 50 mil estarão identificadas.
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Avaliados os custos diretos (consumo de recursos dos sistemas de saúde) e indiretos (perda de produtividade laboral, por exemplo), a esquizofrenia é considerada a 11.ª causa mais importante da carga de doença, medida pelo total de anos vividos com incapacidade.
"Nas várias tipologias da doença psiquiátrica, a esquizofrenia está entre as mais graves", explica a psiquiatra Ana Matos Pires. "É uma doença crónica, com início mais frequente no final da adolescência. Não há uma causa única. Na verdade, ela é determinada por vários fatores. O que sabemos é que há fatores biológicos relacionais na sua génese, como existência de algum histórico familiar", aponta a coordenadora de saúde mental da região do Alentejo.
"A maioria dos doentes permanece cronicamente doente, com exacerbações e remissões dos sintomas", acrescenta Licínio Santos, psiquiatra no Hospital Central do Funchal (Madeira). Ainda assim, explica o médico, vale a pena ter em conta que "se é verdade que em 20% dos casos, os mais graves, é necessário tratamento muito rigoroso, também é verdade que 60% dos casos precisam de ajuda, pessoal ou institucional, e nos restantes 20% conseguimos alcançar a remissão dos sintomas".
Em todo o caso, a esquizofrenia tem sérias implicações "em diferentes domínios da vida humana, nomeadamente aqueles relacionados com o trabalho, educação, relações interpessoais, capacidade para viver de forma independente prestar autocuidados", lê-se no estudo "Custo e carga da esquizofrenia em Portugal", publicado em 2017.
Alucinações e delírios são os sintomas mais característicos da doença. No primeiro caso, "há alterações profundas nos cinco sentidos sensoriais, naquilo que doentes ouvem, veem, cheiram, tocam, saboreiam", explica Ana Matos Pires. No segundo caso, "registam-se mudanças muito significativas no modo como pensam. Se um doente com esquizofrenia julga que está a ser perseguido, não há raciocínio lógico que desmonte a sua crença", frisa a médica. "As pessoas não têm noção de que estão doentes - e isso desestrutura toda a sua vida".
As "alterações comportamentais", mais ou menos bruscas, são o primeiro sintoma da doença, assinala Licínio Santos. "As pessoas sentem-se mais fechadas sobre si mesmas, mas não se queixam, não se apercebem do que está a acontecer. A doença vai evoluindo gradualmente", acrescenta Ana Matos Pires.
Decisivo é, para a psiquiatra, "passar mais informação sobre a doença, porque a nossa literacia em saúde mental é baixíssima". Tendo em conta a importância do diagnóstico precoce, "o tema devia ser abordado a nível escolar". Na verdade, sem intervenção atempada, os doentes ficam mais sujeitos ao que a psiquiatra chama "o paradigma do estigma social". "Para ofender outra pessoa, ninguém diz " você é um diabético", mas diz "você é um esquizofrénico", exemplifica a médica.
Apesar de tudo, Licínio Santos vê sinais de esperança. "É verdade que importa aumentar a sensibilização e a consciencialização para este problema. Mas, hoje, sobretudo junto dos profissionais de saúde, há cada vez mais recursos para lutar contra esse estigma".