Hélder Claro procurou dois bancos para depositar milhares de milhões de euros, alegadamente de um cidadão iraniano. As operações suspeitas foram recusadas e desencadearam um alerta que culminou numa acusação de corrupção e associação criminosa, entre outros crimes, ao ex-juiz e nove cúmplices.
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A ideia do ex-juiz, demitido em maio deste ano, era converter 45 mil milhões de dólares em euros para depois investir em África. O negócio não avançou por falta de idoneidade do suposto investidor. Foi emitido um alerta bancário que desencadeou uma investigação do Ministério Público (MP).
Foram descobertos indícios que culminaram agora na acusação do ex-juiz e nove cúmplices dos crimes de associação criminosa, corrupção, angariação de mão de obra ilegal, auxílio à imigração ilegal com intenção lucrativa e aquisição de cartões obtidos mediante crime informático.
Depositar 45 mil milhões de euros
Em interrogatório, Hélder Claro confirmou os contactos junto do BCP e da Caixa Geral de Depósitos (CGD) em 2018. Pretendia concretizar aplicações na ordem dos 45 mil milhões de euros em nome de Farim Korooriam Motlagh, cliente de Domingos Costa. O ex-juiz alega que pediu aos bancos para efetuarem o "compliance" do iraniano, tendo-lhe sido comunicado que o alegado investidor era "pessoa suspeita" e, por isso, as operações foram recusadas.
Para o MP, "tudo indica que Domingos Costa, por si e/ou por intermédio de Hélder Claro, ou ambos em conjugação de esforços, dispuseram-se a colaborar com os «investidores marroquinos», ou, eventualmente de outra nacionalidade, na realização de investimentos financeiros em Portugal com fundos cuja origem não conseguiam explicar".
Existência ou preparação de esquema criminoso
As tentativas de abertura das contas "inculcam a existência ou preparação de um esquema criminoso". Porém, apesar dos esforços da investigação, não foi possível apurar quem seriam os investidores. E não se sabe se, não fosse a recusa dos bancos, o ex-juiz teria conseguido concretizar o que propôs. Ou seja, explica o MP, ficou por esclarecer se os valores que Hélder Claro tentou depositar efetivamente existem ou existiam e, a existirem, qual a sua proveniência.
Portanto, apesar de os indícios recolhidos confirmarem "suspeitas da pratica de atividades tendentes ao branqueamento de vantagens provenientes de atividades ilícitas e de ocultação de valores", não são suficientes para deduzir acusação por branqueamento e fraude fiscal. O MP concluiu pelo arquivamento dos autos.
Recebia comissões de intermediação
A investigação apurou ainda que, pelo menos desde março de 2019, Hélder Claro se dedicava à mediação e promoção imobiliária com Carlos Moura Guedes e a empresa Imopartner. O ex-juiz fazia prospeção de mercado e até negociava em nome da firma.
Em 2018, Hélder Claro desenvolveu esforços para negociar a compra de parte do empreendimento Dallas, no Porto, e do Edifício Marmoiral, em Castelo de Paiva. O primeiro foi vendido a outros investifores. Já o segundo negócio não se concretizou porque o comprador não conseguiu justificar perante o vendedor, o BCP, a origem dos capitais que ia utilizar.
O ex-juiz recebeu, em 2021 e 2022, três transferências de 5 mil euros de Moura Guedes, comissões de intermediação que omitiu nas declarações fiscais. Mas, como não ultrapassaram os 15 mil euros por declaração, não são criminalmente puníveis.