O tráfico de cocaína em Portugal é dominado por redes criminosas galegas, com ligações a cartéis colombianos e que usam empresas portuguesas para importar a droga do Brasil, mas também do Paraguai. No entanto, organizações criminosas como a italiana 'Ndrangheta, a brasileira Primeiro Comando da Capital (PCC) ou os grupos motards Hell Angel's e Los Bandidos também estão implementados no país. A conclusão está expressa na última edição do "Relatório Global sobre Cocaína", da Organização das Nações Unidas (ONU), publicado nesta quinta-feira. Um documento que constata que a produção de folha de coca, utilizada para a cocaína, bateu recordes na Bolívia, Peru e Colômbia.
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Segundo os especialistas da ONU, a cocaína entra na Europa por duas vias. A principal usa o Mar do Norte para chegar à Bélgica, Países Baixos e Alemanha. A outra tem como destino a Península Ibérica. "Apesar da expansão dos canais do Mar do Norte, a Península Ibérica mantém-se como uma grande porta de entrada de cocaína destinada aos mercados da Europa Ocidental e Central. A localização de Portugal e a sua extensa costa atlântica torna o país num ponto natural de entrada de cocaína", lê-se no relatório.
A ONU explica que "quantidades significativas de cocaína são traficadas pelos portos principais, ocultas entre carga legítima" transportada em contentores marítimos". "Mas também há muita droga a chegar ao Algarve e às ilhas dos Açores e Madeira, escondida em embarcações de recreio e iates".
Empresários nacionais como aliados
O "Relatório Global sobre Cocaína 2023" garante que parte do "tráfico em Portugal é gerido por grupos baseados em Espanha, incluindo Galiza", e que grande parte da droga destinada a esta região espanhola "é descarregada à noite, em praias do Norte de Portugal, e transportada por terra" para o outro lado da fronteira. Noutros casos, os traficantes espanhóis vão buscar a droga ao "navio-mãe que navega a distâncias tão longas [da costa] como os Açores ou Cabo Verde". A cocaína é, posteriormente, levada para terra em "pequenos barcos, veleiros ou pesqueiros".
Aliás, o documento sustenta que redes galegas constroem "lanchas rápidas", que tanto são utilizadas para transportar droga como para traficar migrantes.
Procurador português confirma domínio galego
Um procurador da República Portuguesa entrevistado pela ONU confirmou que "grupos espanhóis tendem a viajar para Portugal para estabelecer ligações com intermediários portugueses". Estes são, quase sempre, "empresários com negócios de importação, que aceitam receber a cocaína em Portugal, oculta em produtos legais, muitas vezes fruta, em troca de um pagamento".
"Os empresários retiram a droga oculta na mercadoria, entregam-na aos espanhóis e são estes que a transportam para Espanha e, em seguida, distribuem-na pela Europa", descreveu o magistrado português.
O documento da ONU identificou, ainda, a presença de elementos da 'Ndrangheta, do PCC, dos Hell Angel's e dos Los Bandidos em Portugal. Estes mantêm ligações a grupos portugueses "que ficam com uma porção (30 a 40%) das grandes cargas de cocaína que ajudam a importar".
Só em 2020, foram detidos em Portugal mais de 50 brasileiros e mais de 30 cabo-verdeanos devido ao tráfico de cocaína. Detidos por este crime foram ainda quase 20 espanhóis, cerca de dez guineenses e cidadãos do Reino Unido, França, Itália, Letónia, Colômbia e República Dominicana.