Magistrados propõem "agravamento acentuado" das molduras penais dos crimes económico-financeiros. Advogados céticos.
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O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) defende que as penas previstas para a corrupção e crimes conexos estão "completamente desajustadas". "São do tempo da dita corrupção do "cafezinho"", critica, propondo um "agravamento acentuado das molduras penais quando estão em causa atuações manifestamente danosas para a sociedade". Esta é uma das 50 medidas propostas ontem pelo SMMP, na sequência da apresentação da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção, que o Governo pôs em discussão pública e vai converter em proposta de lei.
Recuperando uma célebre tirada da procuradora Cândida Almeida, quando esta dirigia o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), o sindicato escreveu que "quem em finais de 2007 afirmava que em Portugal existia apenas corrupção do "cafezinho" e o "tome lá uns euros para fazer andar" estava rotundamente enganado".
A corrupção "já antes de 2007 alastrava no país" e "projeta-se cada vez mais sobre a atividade económica quer pública, quer privada, entorpecendo o livre desenvolvimento económico do país e atingindo o sistema social e as estruturas do Estado", avalia o SMMP, ao defender o agravamento, que não quantifica, das penas. Neste momento, o limite máximo da moldura do crime de corrupção são dez anos e oito meses.
Na mesma linha, o sindicado presidido por António Ventinhas também propõe que os corruptos só possam ter liberdade condicional após os dois terços da pena (e não metade); que a suspensão da mesma seja sempre subordinada a deveres ou regras de conduta; e que o prazo de prescrição do procedimento criminal seja alargado a 20 anos.
Mas o SMMP avisa que, antes de mais, é preciso dotar o Ministério Público e Polícia Judiciária de mais recursos humanos. Uma ideia de corroborada ontem, pela Ordem dos Advogados, de que é bastonário Luís Menezes Leitão. "Enquanto não foram implementadas com efetividade, no terreno, as diversas medidas legislativas já abundantemente existentes no nosso ordenamento jurídico, de nada adiantará continuar a produzir legislação em massa", diz a Ordem no seu parecer sobre a estratégia do Governo.
Os advogados também apontam a área da contratação pública, criticando uma alteração legislativa de 2019 que isentou de fiscalização prévia do Tribunal de Contas contratos de valor até 750 mil euros - quando anteriormente o limite era de 350 mil.
OUTRAS PROPOSTAS
Dispensa de pena
O Sindicato quer dispensa de pena para quem denuncie crimes de corrupção, participação económica em negócio e recebimento indevido de vantagem, mesmo antes do inquérito, ao contrário do que defende a estratégia da ministra da Justiça.
Advogados contra
Os advogados dizem que "o denunciante, profissional de uma organização, só porque denuncia, não poderá ser prejudicado, mas também não será beneficiário de qualquer prémio". A Ordem vê a "delação premiada" como forma de "suprir as ineficiências e incapacidade do sistema político, investigatório e judicial".
DCIAP no Porto
O SMMP defende a criação de um polo do DCIAP no Porto e quer procuradores a defenderem as suas acusações em julgamento.