O julgamento dos militares do Exército acusados de vários crimes relacionados com a morte de dois recrutas dos Comandos foi suspenso esta quinta-feira por, pelo menos, 48 horas. Dos 19 arguidos, só um pretende falar nesta fase.
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O julgamento de 19 militares acusados de 539 crimes, alegadamente cometidos durante o curso de Comandos em que morreram, em 2016, os recrutas Hugo Abreu e Dylan da Silva, foi suspenso ao final da manhã durante pelo menos 48 horas, por questões processuais.
Em causa, está o facto de, na primeira sessão do julgamento, o procurador do Ministério Público (MP) ter solicitado que os pedidos de indemnização civil ao Estado, interpostos pelas famílias das vítimas, sejam apreciados nos tribunais administrativos e não no âmbito deste processo judicial, de modo a que José Nisa não represente, simultaneamente, o acusador e o réu.
"Se [o senhor procurador] sustentar a acusação e conseguir que, no final deste processo, exista uma condenação com todos os termos da acusação (...), vai ter também o seu demandado, o Estado português, condenado. (...) Há claramente um conflito de interesses", explicou à saída do tribunal, Miguel Pereira, representante da mãe de Dylan da Silva, assistente no processo.
O mesmo salientou Ricardo Sá Fernandes, advogado da família de Hugo Abreu, ressalvando, porém, que a questão, "pertinente", poderia ter sido suscitado "há mais tempo". "Tínhamos pedido expressamente que (...) fosse demandado, para o pedido de indemnização civil, o Estado através do Exército. Só que o Exército nunca foi citado, o Estado nunca foi citado e, portanto, estamos aqui com este problema por resolver", sublinhou aos jornalistas.
Para já, os representantes das famílias - que recusaram a proposta do procurador do MP - têm 48 horas para se pronunciar, ficando o julgamento suspenso por esse período. Mas, se como defendem, os pedidos de indemnização não forem separados do processo atual, o Estado português será notificado e terá então 30 dias para responder. Só depois o julgamento poderá ser retomado.
"Ainda que possa vir a acontecer uma suspensão do prazo, é preferível que seja agora do que depois termos de repetir todo este julgamento daqui a alguns anos", na sequência de um recurso, considerou Miguel Pereira. O advogado teme, porém, que o julgamento venha a sofrer atrasos por questões logísticas, nomeadamente a inexistência de salas para receber o julgamento. "Se não existisse um problema do ponto de vista logístico, estaríamos descansados", concluiu ao JN.
Hugo Abreu e Dylan Silva, à data com 20 anos, morreram a 4 e 10 de setembro de 2016, respetivamente, depois de terem sofrido um "golpe de calor" no primeiro dia do 127.º Curso de Comandos, em Alcochete. Outros nove militares foram hospitalizados. Em julgamento estão 19 militares, acusados de 539 crimes de abuso de autoridade e ofensa à integridade física.
Nesta primeira sessão, apenas um dos 19 arguidos - Rui Passos Monteiro, comandante da companhia de formação - tencionava prestar declarações, com os restantes a remeterem-se ao silêncio.