Rittenhouse, que matou duas pessoas num protesto contra a violência policial, foi absolvido e saiu do tribunal a chorar de alívio. As reações não tardaram. Há júbilo e revolta contra um sistema que, acusam, é "baseado na supremacia branca".
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Alívio para uns, indignação para outros. A absolvição - sem hipótese de recurso - do americano Kyle Rittenhouse, de 18 anos, que matou duas pessoas durante uma noite de protestos antirraciais no tumultuoso verão de 2020, em Kenosha, no Wisconsin, fez aquecer o debate sobre a questão fraturante das armas de fogo e o funcionamento da Justiça nos EUA.
Logo a seguir à decisão, conhecida na sexta-feira, o movimento "Black Lives Matter" reconheceu, no Twitter, não ter ficado surpreendido. "É assim que o sistema conspira para consolidar a supremacia branca", escreveram os ativistas. A prever um despertar da violência, o presidente Joe Biden pediu, numa reação rápida em frente à Casa Branca, que a deliberação do tribunal fosse respeitada. No entanto, mais tarde, confessou estar zangado e preocupado. "Embora o veredicto de Kenosha deixe muitos americanos zangados e preocupados, eu inclusive, devemos reconhecer a decisão do júri", realçou, em comunicado.
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Uma posição bastante diferente da do antecessor. O republicano Donald Trump, que já tinha defendido Rittenhouse publicamente após o incidente, mostrou-se satisfeito com o desfecho do caso. "Parabéns a Kyle Rittenhouse por ser declarado inocente", sublinhou, numa nota divulgada pelo seu porta-voz", reforçando a tese de que o jovem, que poderia ter sido condenado a prisão perpétua, atuou em legítima defesa.
Para o mayor de Nova Iorque, Bill de Blasio, o veredicto é "nojento". "Isto manda uma mensagem horrível ao país", escreveu, no Twitter. "Chamar a isto erro judicial é um eufemismo". Também o grupo ativista "Moms demand", que luta contra a violência armada, se mostrou indignado, defendendo que um adolescente matar duas pessoas sem que existam consequências criminais "é uma negação da justiça". "Estes também são os EUA que criaram a NRA", realçou a fundadora, Shannon Watts, referindo-se ao poderoso lobby de armas da Associação Nacional das Armas, defensora do direito ilimitado ao porte de armas.
O advogado Ben Crump, que defendeu várias vítimas de violência policial, nomeadamente George Floyd, sublinhou que a decisão é "um novo exemplo de justiça a duas velocidades na América". "Se Rittenhouse fosse negro, os debates no tribunal e seu resultado teriam sido diferentes", lamentou. E o ex-futebolista americano Colin Kaepernick, conhecido por se ter ajoelhado, durante o hino nacional, em protesto contra a violência policial contra afro-americanos também foi perentório. "Acabámos de assistir à validação de atos terroristas por um sistema baseado na supremacia branca", frisou.
Os disparos fatais ocorreram em agosto de 2020, quando Rittenhouse se juntou a grupos armados que diziam querer proteger a cidade de saqueadores e incendiários, numa altura em que Kenosha foi palco de tumultos depois de a polícia ter alvejado sete vezes um jovem negro, Jacob Blake. Em circunstâncias pouco claras, Kyle abriu fogo e atingiu três homens: dois morreram e outro ficou ferido. "Não fiz nada de errado, apenas me defendi", garantiu, durante o julgamento, acrescentando que agiu por se sentir perseguido e atacado.
Um "herói" cem vezes arrependido
O jovem, que permaneceu em liberdade durante as duas semanas do julgamento, tornou-se uma referência nos círculos da extrema-direita. Foi o "herói" dos meios de comunicação social conservadores e de vários legisladores republicanos.
Se está arrependido de, naquela noite, ter ido a Kenosha? "Cem vezes", garantiu o advogado de Kyle, horas depois de anunciada a absolvição dos cinco crimes, entre os quais homicídio voluntário de primeiro grau, homicídio imprudente de primeiro grau e posse de arma perigosa.
Ainda assim, clarificou Mark Richards, não se trata de "arrependimento pelo que fez naquela noite, naquelas circunstâncias".